Com uma linguagem clara e simples, provavelmente já avançado em idade – e os seus consequentes desencantos –, Saba redige estas linhas, lídima parábola para o existir humano: se a juventude e boa parte da idade adulta transcorrem sob o peso das responsabilidades, chega um momento, já quase no ocaso, em que as coisas se tornam menos pesarosas.
E então sobrevêm a poesia, as digressões e os entretenimentos, algo mais próximo da felicidade – ou mais distante da infelicidade, tal como se queira! –, tornando nossos passos “mais leves”, permitindo, assim, que assumamos a face da bondade e dissipemos toda aquela dor que, um dia, teimou em nos submeter às agruras de uma vida molesta e cansativa.
J.A.R. – H.C.
Umberto Saba
(1883-1957)
Felicità
La giovanezza cupida di pesi
porge spontanea al carico le spalle.
Non regge. Piange di malinconia.
Vagabondaggio, evasione, poesia,
cari prodigi sul tardi! Sul tardi
l’aria si affina ed i passi si fanno
leggeri.
Oggi è il meglio di ieri,
se non è ancora la felicità.
Assumeremo un giorno la bontà
del suo volto, vedremo alcuno sciogliere
come un fumo il suo inutile dolore.
In: “Il Canzoniere” (1945)
San Giorgio Maggiore ao Entardecer
(Claude Monet: pintor francês)
Felicidade
A juventude ávida por fardos
inclina espontaneamente os ombros à carga.
Não resiste. Chora de melancolia.
Vadiagem, evasão, poesia,
caros prodígios tardios! Ao fim do dia,
o ar se afina e os passos tornam-se
mais leves.
Hoje é melhor do que ontem,
mesmo que ainda não seja a felicidade.
Um dia assumiremos a bondade
de seu rosto, veremos alguns derreterem
sua dor inútil como uma fumaça.
Em: “O Cancioneiro” (1945)
Referência:
SABA, Umberto. Felicità. In: PAYNE,
Roberta L. (Edition and Translation). A selection of modern italian poetry
in translation. A bilingual edition: Italian x English. Montreal &
Kingston, CA: McGill-Queen’s University Press, 2004. p. 100 and 102.
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