Os mortos, parentes ou amigos, de quem se encontra vivo, continuam vivos na memória de quem aqui ficou, com prazo de sobrevivência equivalente ao da sobrevida que o vivo lhes dá na mente, ou mais bem, em alguns casos, morrem definitivamente quando morre fisicamente o que lhes abrigava de forma indelével no espírito.
Picchia é mais enfático quanto à morte que ocasionamos aos mortos, no momento em que “os enterramos em nós mesmos”: tal espécie de “enterro” representa muito mais que o enterro fático do falecido, pois atira no mais completo olvido uma história materializada com anelo de um fogo eterno, todavia para sempre expirado.
J.A.R. – H.C.
Menotti del Picchia
(1892-1988)
Os Mortos
E inútil que cubram de terra os corpos.
Eles saem do chão
não como fantasmas
mas vivos.
Sentam-se às nossas mesas
comem soturnos nossa sopa misturada com lágrimas.
Sabemos que não são imortais
e que essa sobrevivência tem prazo.
Um dia, porém
quando?
(dessa data nem nos damos conta)
evaporam-se...
Somos nós que matamos nossos mortos
e os enterramos em nós mesmos.
Sem título
(Marsi Paribatra: artista tailandesa)
Referência:
PICCHIA, Menotti del. Os mortos. In: CONGÍLIO,
Mariazinha (Selecção e Coordenação). Antologia de poetas brasileiros. 1.
ed. Lisboa, PT: Universitária Editora, 2000. p. 143.
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