Muito se perdeu da forma de comemorar os Natais antigos − ou mesmo do próprio espírito do Natal − hoje, bem mais voltado a comprar e consumir, e menos a celebrar a união com a família e com o divino: segundo o poeta, o coração já não sente quaisquer emoções a respeito, tanto mais em razão de que passou a vivenciá-lo em clima mais tórrido.
O Natal, hoje em dia, é muito sobre o que você não tem ou mesmo obrigar-se a fazer coisas que você não está disposto a fazer, um “desistir da jornada” sem coragem para retornar: quer o autor se expresse metaforicamente quer não, o fato é que o “calor” − antes presente nos laços familiares ou de amizade, a esta época −, era, sem dúvida, mais autêntico e mais intenso.
J.A.R. – H.C.
Reinaldo Ferreira
(1922-1959)
Natal de Longe
Natal!... Natal!...
A boca o diz,
A mão o escreve,
O coração já não sente.
Que a emoção,
Vibração
Das asas da fantasia
No voo do pensamento,
Deixou-se ficar parada
Só porque a noite está quente;
Só porque ser indolente
É como parar na estrada
E desistir da jornada,
Sem coragem de voltar
Pelo caminho tão rude!
Natal!... Natal!...
A doce força que tinha
Devorou-a a latitude.
Burgo no Natal
(Thomas Kinkade: pintor norte-americano)
Referência:
FERREIRA, Reinaldo. Natal de longe. In:
__________. Poemas. Prefácio de José Régio. 2. ed. Lisboa, PT:
Portugália, mai.1966. p. 142. (Coleção ‘Poetas de Hoje’; v. 21)
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