Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

Gilberto Mendonça Teles - Peru de Natal

Não há que se entrar em controvérsias sobre o fato de que a época do Natal é uma quadra mais de sentimentos do que de compreensão ponderada à luz da lógica ou da razão: é por isso que o poeta estende os efeitos dessa sensibilidade aflorada ao próprio peru que, já sem vida e recheado, vai lhe ornar o espaço à mesa da ceia natalina, de quem se ouviria um subentendido “gluglu sentimental”.

Transcorrido mais um ano, segundo Teles, todos sentiriam a pressão do tempo em suas vidas, motivo por que se precipitariam em esquadrinhar aquilo que ressoa a urgência da existência, trazendo o que já longe vai para mais perto: brinquedos, nozes e aquela alegria incontida do tempo de infância.

J.A.R. – H.C.

 


Gilberto Mendonça Teles
(n. 1931)

 

Peru de Natal

 

Quando se avizinha o Natal,

a vizinha põe uns enfeites na porta

e a avezinha que fez ninho no ar refrigerado

foge desesperada do verão.

 

Não é apenas com intuito comercial

que as lojas se vestem de cores e de luzes,

nem por simples consumismo que se gasta

doidamente o décimo-terceiro.

 

Por detrás de cada coisa adquirida

existe a música do Tempo ressoando

nos brinquedos, nas nozes e na alegria

de se saber mais próximo de tudo.

 

Os homens sentem o peso dos relógios

e sabem que é preciso investir mais na vida:

desconfiam que os sinos sempre anunciam

mais um segundo da Eternidade.

 

Daí porque um sujeito desconfiado

como eu fica arredio no Natal:

é que até o peru, mesmo recheado,

tem lá o seu gluglu sentimental.


Estarei em casa no Natal
(Norman Rockwell: ilustrador norte-americano)


Referência:

TELES, Gilberto Mendonça. Peru de Natal. In: __________. Hora aberta: poemas reunidos. Organização Eliane Vasconcelos. 4. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2003. p. 60-61.

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