Unamuno, grande filósofo e poeta
espanhol, acerca-se, transversalmente, do tema da imortalidade neste poema, a
enfocar a vida como uma espécie de esperança que, em seu fluxo, converte-se em
memórias e, estas, por sua vez, retroalimentam novas esperanças, num sonho da
alma que se lança do passado ao futuro, transbordando para o outro lado do
nosso destino − onde as Parcas tecem os seus fios.
Na essência do homem está esse desejo
de fazer persistir o seu ser indefinidamente e, para tanto, não há outra medida,
neste mundo de aparências, que não seja o amor a triunfar sobre o vão e o
transitório, para encher a vida de significado, para dissipar a perspectiva de incerteza
e dúvida de que a morte se guarnece.
J.A.R. – H.C.
Miguel de Unamuno
(1865-1936)
Con recuerdos de
esperanzas
Con recuerdos de
esperanzas
y esperanzas de
recuerdos
vamos matando a vida
y dando vida al
eterno
descuido que del
cuidado
del morir nos
olvidemos...
Fué ya otra vez el
futuro,
será el pasado de
nuevo,
mañana y ayer mejidos
en el hoy se quedan
muertos.
Me he despertado
soñando,
soñé que estaba
despierto,
soñé que el sueño era
vida,
soñé que la vida es
sueño.
Sentí que estaba
pensando,
pensé que sentia, y
luego
vi reducirse a
cenizas
mis pensamientos de
fuego.
Si hay quien no
siente la brasa
debajo de estos
conceptos,
es que en su vida ha
pensado
con su próprio
sentimiento;
es que en su vida ha
sentido
dentro de sí al
pensamiento.
Flores da el amor al
hombre,
flores entre hojas al
viento,
mas también le da
diamantes
duros, cortantes y
escuetos.
No sólo el vapor
calienta;
no llaméis frío a lo
seco;
la carne enfría a
menudo
y suele quemar los
huesos.
O sonho de Jacó
(Ary de Vois: pintor
holandês)
Com lembranças de
esperanças
Com lembranças de
esperanças
e esperanças de
lembranças
vamos matando a vida,
e dando vida ao
eterno
descuido que do
cuidado
de morrer nos olvidamos...
Já foi outra vez o
futuro,
será o passado de
novo,
amanhã e ontem
mesclados
no hoje quedam-se
mortos.
Despertei-me
sonhando,
sonhei que estava
desperto,
sonhei que o sonho
era vida,
sonhei que a vida é
sonho.
Senti que estava desperto,
pensei que sentia, e
logo
vi reduzir-se a
cinzas
meus pensamentos de
fogo.
Se há quem não sente
a brasa
debaixo destes
conceitos,
é que em sua vida
pensou
com seu próprio
sentimento,
é que em sua vida
sentiu
dentro de si ao
pensamento.
Flores o amor dá ao
homem,
flores entre folhas
ao vento,
mas também lhe dá
diamantes
duros, cortantes e
concisos.
Nem só o vapor
aquece,
não chames de frio ao
seco,
a carne esfria amiúde
e costuma queimar os
ossos.
Referência:
UNAMUNO, Miguel de. Con recuerdos de
esperanzas / Com lembranças de esperanças. Tradução de Elson Fróes. In: FRÓES,
Elson. Poemas traduzidos. Edição eletrônica, copyright © Elson Fróes, 2003.
Em espanhol: p. 20; em português: p. 21.
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