Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 1 de novembro de 2020

Miguel de Unamuno - Com lembranças de esperanças

Unamuno, grande filósofo e poeta espanhol, acerca-se, transversalmente, do tema da imortalidade neste poema, a enfocar a vida como uma espécie de esperança que, em seu fluxo, converte-se em memórias e, estas, por sua vez, retroalimentam novas esperanças, num sonho da alma que se lança do passado ao futuro, transbordando para o outro lado do nosso destino − onde as Parcas tecem os seus fios.

Na essência do homem está esse desejo de fazer persistir o seu ser indefinidamente e, para tanto, não há outra medida, neste mundo de aparências, que não seja o amor a triunfar sobre o vão e o transitório, para encher a vida de significado, para dissipar a perspectiva de incerteza e dúvida de que a morte se guarnece.

J.A.R. – H.C.

Miguel de Unamuno
(1865-1936)

Con recuerdos de esperanzas

Con recuerdos de esperanzas
y esperanzas de recuerdos
vamos matando a vida
y dando vida al eterno
descuido que del cuidado
del morir nos olvidemos...
Fué ya otra vez el futuro,
será el pasado de nuevo,
mañana y ayer mejidos
en el hoy se quedan muertos.
Me he despertado soñando,
soñé que estaba despierto,
soñé que el sueño era vida,
soñé que la vida es sueño.
Sentí que estaba pensando,
pensé que sentia, y luego
vi reducirse a cenizas
mis pensamientos de fuego.
Si hay quien no siente la brasa
debajo de estos conceptos,
es que en su vida ha pensado
con su próprio sentimiento;
es que en su vida ha sentido
dentro de sí al pensamiento.
Flores da el amor al hombre,
flores entre hojas al viento,
mas también le da diamantes
duros, cortantes y escuetos.
No sólo el vapor calienta;
no llaméis frío a lo seco;
la carne enfría a menudo
y suele quemar los huesos.

O sonho de Jacó
(Ary de Vois: pintor holandês)

Com lembranças de esperanças

Com lembranças de esperanças
e esperanças de lembranças
vamos matando a vida,
e dando vida ao eterno
descuido que do cuidado
de morrer nos olvidamos...
Já foi outra vez o futuro,
será o passado de novo,
amanhã e ontem mesclados
no hoje quedam-se mortos.
Despertei-me sonhando,
sonhei que estava desperto,
sonhei que o sonho era vida,
sonhei que a vida é sonho.
Senti que estava desperto,
pensei que sentia, e logo
vi reduzir-se a cinzas
meus pensamentos de fogo.
Se há quem não sente a brasa
debaixo destes conceitos,
é que em sua vida pensou
com seu próprio sentimento,
é que em sua vida sentiu
dentro de si ao pensamento.
Flores o amor dá ao homem,
flores entre folhas ao vento,
mas também lhe dá diamantes
duros, cortantes e concisos.
Nem só o vapor aquece,
não chames de frio ao seco,
a carne esfria amiúde
e costuma queimar os ossos.

Referência:

UNAMUNO, Miguel de. Con recuerdos de esperanzas / Com lembranças de esperanças. Tradução de Elson Fróes. In: FRÓES, Elson. Poemas traduzidos. Edição eletrônica, copyright © Elson Fróes, 2003. Em espanhol: p. 20; em português: p. 21.

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