Como o próprio título sugere, este poema é um salmo, uma oração ou uma
música noturna de um povo direcionada a alguém que, denominado “Ninguém”,
sugere a palavra “Deus”, haja vista as referências a passagens narradas no
Gênesis, quando o Eterno teria criado o homem – e a mulher – à sua imagem, a partir
do barro da terra, insuflando-lhe nas narinas um hálito de vida.
Pode-se facilmente deduzir que Celan aluda ao povo judeu, cuja fé no
Deus Uno muito se abalou durante as agruras da 2GM, mas que não deixou de
revelar ao mundo o primado de sua consciência espiritual: entre os espinhos da
rosa há a beleza das pétalas rubras, derivadas de um processo de sublimação rumo
à transcendência, a afigurar o renascer para uma nova vida.
J.A.R. – H.C.
Paul Celan
(1920-1970)
Psalm
Niemand knetet uns
wieder aus Erde und Lehm,
niemand bespricht
unseren Staub.
Niemand.
Gelobt seist du,
Niemand.
Dir zulieb wollen
wir blühn.
Dir
entgegen.
Ein Nichts
waren wir, sind wir,
werden
wir bleiben, blühend:
die Nichts –, die
Niemandsrose.
Mit
dem Griffel
seelenhell,
dem Staubfaden
himmelswüst,
der Krone rot
vom Purpurwort, das
wir sangen
über, o über
dem Dorn.
Sindicato da Guilda dos Tecelões
(Rembrandt: pintor
holandês)
Salmo
Ninguém nos molda de
novo com terra e barro,
ninguém evoca o nosso
pó.
Ninguém.
Louvado sejas,
Ninguém.
Por ti queremos
florescer.
Ao teu
encontro.
Um nada
éramos nós, somos,
continuaremos
sendo, florescendo:
a rosa-de-nada, a
rosa-de-ninguém.
Com
o estilete claralma,
o estame alto-céu,
a coroa rubra
da palavra púrpura,
que cantamos
sobre, oh, sobre
o espinho.
Referência:
CELAN, Paul. Psalm / Salmo. Tradução de
Claudia Cavalcanti. In: __________. Cristal.
Seleção e tradução de Claudia Cavalcanti. Edição bilíngue. 2. Reimp. São Paulo:
Iluminuras, 2011. Em alemão: p. 94; em português: p. 95.
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