Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

Stéphane Mallarmé - Aparição

Mallarmé, em sua tentativa de encontrar, no amor, um meio de converter o ideal em manifestação real, transfigura a relação com sua esposa em outro tipo de vínculo com a figura da fada-mulher: a do vulto materno, acomodando-o nos versos finais do poema.

As coisas mudam na vida e ela avança sob o efeito de nossas escolhas: se, no início, tudo aparenta emergir de um sonho, com as descrições da natureza imprimindo um tom melancólico ao poema; no fim, é a própria natureza que parece compartilhar o humor do poeta, fazendo jorrar celestiais estrelas perfumadas dentre as mãos mal fechadas da metaforizada fada.

J.A.R. – H.C.

Stéphane Mallarmé
(1842-1898)

Apparition

La lune s’attristait. Des séraphins en pleurs
Rêvant, l’archet aux doigts, dans le calme des fleurs
Vaporeuses, tiraient de mourantes violes
De blancs sanglots glissant sur l’azur des corolles.
– C’était le jour béni de ton premier baiser.
Ma songerie aimant à me martyriser
S’enivrait savamment du parfum de tristesse
Que même sans regret et sans déboire laisse
La cueillaison d’un Rêve au coeur qui l’a cueilli.

J’errais donc, l’oeil rivé sur le pavé vieilli
Quand avec du soleil aux cheveux, dans la rue
Et dans le soir, tu m’es en riant apparue
Et j’ai cru voir la fée au chapeau de clarté
Qui jadis sur mes beaux sommeils d’enfant gâté
Passait, laissant toujours de ses mains mal fermées
Neiger de blancs bouquets d’étoiles parfumées.

Aparição
(Odilon Redon: pintor francês)

Aparição

A lua estava triste. Arcanjos sonhadores
Em pranto, o arco nas mãos, no sossego das flores
Aéreas, vinham tirar de evanescentes violas
Alvos ais resvalando entre o azul das corolas.
– Era o dia feliz de teu primeiro beijo.
Para me torturar, meu sonho, meu desejo
Embriagavam-se bem do perfume de queixa
Que mesmo sem remorso e sem motivo deixa,
No coração que o colhe, a colheita de um sonho.

Eu ia à toa, o olhar no chão velho e tristonho,
Quando trazendo nos cabelos um sol lindo,
Na alameda e na tarde apareceste rindo.
E eu julguei ver, com seu chapéu de luz, a fada
Que nos meus sonhos bons de criança mimada
Sempre deixou nevar dentre as mãos mal fechadas
Punhados celestiais de estrelas perfumadas.

Referência:

MALLARMÉ, Stéphane. Apparition / Aparição. Tradução de Guilherme de Almeida. In: ALMEIDA, Guilherme de (Seleção e tradução). Poetas de França. Prefácio de Marcelo Tápia. 5. ed. São Paulo, SP: Babel, 2011. Em francês: p. 76; em português: p. 77.

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