Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Konstantinos Kaváfis - O Deus abandona Antônio

O poeta grego se reporta ao desenlace da Batalha de Áccio, na qual as forças de Cleópatra e Marco Antônio sucumbiram às de Otaviano, tendo o Deus de Antônio – Dionísio pelo que se sabe – o abandonado, levando-o a perder tudo o que ganhara em sua vida de muitas lutas, motivo pelo qual veio a cometer suicídio “com dignidade”, aliás, assim como Cleópatra o fez posteriormente.

O enredo dessa história já o conhecemos da peça “Antônio e Cleópatra” (1607), de autoria do bardo – há necessidade de nomeá-lo?! –, em cuja Cena II do Ato II se descreve, na fala de Enobarbus, o exato momento em que Antônio conhecera Cleópatra, assim vertido belamente ao português por Barbara Heliodora (1923-2015):

Enobarbus
Eu vou contar-lhes:
A barca em que sentava, trono ardente,
Queimava as águas; era de ouro a popa;
As velas púrpura e tão perfumadas
Que estavam tontos de paixão os ventos;
Eram de prata os remos bem ritmados
Que, ao som das flautas, faziam as águas
Em que batiam correr mais depressa,
Como se amando os golpes. Quanto a ela,
Nenhum retrato a iguala: recostada
Em seu dossel – brocado todo de ouro
Era mais bela do que a própria Vênus
Que, em sonhos, deixa pobre a Natureza.
A seu lado, meninos quais Cupidos
Sorriam, tendo abanos multicores,
Com cujo vento abrasava o que arejavam,
Refazendo o desfeito. (SHAKESPEARE, 2001, p. 64)

J.A.R. – H.C.

Konstantinos Kaváfis
(1863-1933)

Απολείπειν ο θεός Αντώνιον

Σν ξαφνα, ρα μεσάνυχτ’, κουσθε
όρατος θίασος ν περν
μ μουσικς ξαίσιες, μ φωνές
τν τύχη σου πο νδίδει πιά, τ ργα σου
πο πέτυχαν, τ σχέδια τς ζως σου
πο βγκαν λα πλάνες, μ νοφέλετα θρηνήσεις.
Σν τοιμος π καιρό, σ θαρραλέος,
ποχαιρέτα την, τν λεξάνδρεια πο φεύγει.
Πρ πάντων ν μ γελασθες, μν πες πς ταν
να νειρο, πς πατήθηκεν κοή σου·
μάταιες λπίδες τέτοιες μν καταδεχθες.
Σν τοιμος π καιρό, σ θαρραλέος,
σν πο ταιριάζει σε πο ξιώθηκες μι τέτοια πόλι,
πλησίασε σταθερ πρς τ παράθυρο,
κι κουσε μ συγκίνησιν, λλχι
μ τν δειλν τ παρακάλια κα παράπονα,
ς τελευταία πόλαυσι τος χους,
τ ξαίσια ργανα το μυστικο θιάσου,
κι ποχαιρέτα την, τν λεξάνδρεια πο χάνεις.

A Batalha de Áccio
(Lorenzo A. Castro: pintor flamengo)

O Deus abandona Antônio

Quando, à meia-noite, de súbito escutares
um tiaso invisível a passar
com músicas esplêndidas, com vozes –
a tua Fortuna que se rende, as tuas obras
que malograram, os planos de tua vida
que se mostraram mentirosos, não os chores em vão.
Como se pronto há muito tempo, corajoso,
diz adeus à Alexandria que de ti se afasta.
E sobretudo não te iludas, alegando
que tudo foi um sonho, que teu ouvido te enganou.
Como se pronto há muito tempo, corajoso,
como cumpre a quem mereceu uma cidade assim,
acerca-te com firmeza da janela
e ouve com emoção, mas ouve sem
as lamentações ou as súplicas dos fracos,
num derradeiro prazer, os sons que passam,
os raros instrumentos do místico tiaso,
e diz adeus à Alexandria que ora perdes.

(Folhetim, 16.05.82)

Referências:

Em Grego

ΚΑΒΆΦΗΣ, Κωνσταντίνος. Απολείπειν ο θεός Αντώνιον. Disponível neste endereço. Acesso em: 31 out. 2019.

Em Português

KAVÁFIS, Konstantinos. O Deus abandona Antônio. Tradução de José Paulo Paes. In: SUZUKI JR., Matinas; ASCHER, Nelson (Organizadores). Folhetim: poemas traduzidos. São Paulo, SP: Folha de São Paulo, 1987. p. 126.

SHAKESPEARE, William. Antônio e Cleópatra. Tradução de Barbara Heliodora. Rio de Janeiro, RJ: Lacerda, 2001.

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