Inserto na obra “Denní služba” (“Serviço diário”), de 1958, este poema
do autor tcheco reporta-se aos que lutaram em defesa de um ideário que se
plasmou no lema da bandeira francesa – Liberté, Égalité, Fraternité –, cada uma
dessas divisas representada por uma cor, a se considerar a trilogia composta
pelo cineasta polonês Krzysztof Kieslowski (1941-1996): “A Liberdade é Azul”
(1993), “A Igualdade é Branca” (1994) e “A Fraternidade é Vermelha” (1994).
E aos olhos de Holub tudo se passa como se vã fosse a experiência humana
ao longo da história, pois lhe parece que tais divisas não têm capacidade para
ressoar os seus clarins aos que se encontram na lida quotidiana: apenas em
eventuais surtos é que se experimenta algo que possa se afigurar como o
paraíso. Idem, o céu e o inferno. Eis aí o nosso estado patológico em porfiar
no sonho!
J.A.R. – H.C.
Miroslav Holub
(1923-1998)
Pathology
Here in the Lord’s
bosom rest
the tongues of
beggars,
the lungs of
generals,
the eyes of
informers,
the skins of martyrs,
in the absolute
of the microscope’s
lenses.
I leaf through Old
Testament slices of liver,
in the white
monuments of brain I read
the hieroglyphs
of decay.
Behold, Christians,
Heaven, Hell, and
Paradise
in bottles.
And no wailing,
not even a sigh.
Only the dust moans.
Dumb is history
strained
through capillaries.
Equality dumb.
Fraternity dumb.
And out of the
tricolours of mortal suffering
we day after day
pull
threads of wisdom.
O Martírio de São Mateus
(Caravaggio: pintor
italiano)
Patologia
Aqui, no seio do
Senhor, jazem
as línguas dos
mendigos,
os pulmões dos
generais,
os olhos dos
informantes,
as peles dos
mártires,
no absoluto
das lâminas do
microscópio.
Folheio fatias de
fígado de uma ponta a outra
do Velho Testamento,
nas lápides brancas
do cérebro leio
hieróglifos
da decomposição.
Olhai, Cristãos,
Céu, Inferno e
Paraíso
em frascos.
E sem lamento,
nem mesmo um suspiro.
Somente geme a
poeira.
Muda é a história
confrangida
através dos
capilares.
Igualdade muda.
Fraternidade muda.
E do tricolor de mortal
aflição,
os fios de sabedoria,
dia após dia,
puxamos.
Referência:
HOLUB, Miroslav. Pathology. In:
__________. Selected poems. Translated
from Czech to English by Ian Milner and George Theiner. With an Introduction by
A. Alvarez. 1st. publ. Middlesex, EN: Penguin Books, 1967. p. 30. (Penguin
Modern European Poets)
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