Martha espelha o desejo humano de sabedoria com o avanço da idade,
sabedoria que, em tese, associa-se à serenidade frente aos contratempos da
vida, um amor menos condicionado à tangibilidade de nossas buscas mais
frenéticas, e maior capacidade para suportar imperturbavelmente a fragilidade
do corpo.
Os versos finais do poema são bem espirituosos: no limite dos 90 anos, a
poetisa espera “morrer de saudade”, mas quem ali se encontra expõe-se mais
nitidamente à tensão da morte física, e não terá saudades, decerto, senão aqueles
que aqui ficam, sentindo-as do ente que partiu, até que o tempo as atenue.
J.A.R. – H.C.
Martha Medeiros
(n. 1961)
quando chegar
quando chegar aos 30
serei uma mulher de
verdade
nem Amélia nem
ninguém
um belo futuro pela
frente
e um pouco mais de
calma talvez
e quando chegar aos
50
serei livre, linda e
forte
terei gente boa ao
lado
saberei um pouco mais
do amor
e da vida quem sabe
e quando chegar aos
90
já sem força, sem
futuro, sem idade
vou fazer uma festa
de prazer
convidar todos que
amei
registrar tudo que
sei
e morrer de saudade
Em: “Meia-Noite e um Quarto” (1987)
Mulher em azul lendo uma carta
(Johannes Vermeer:
pintor holandês)
Referência:
MEDEIROS, Martha. quando chegar. In:
__________, Poesia reunida. Porto
Alegre, RS: L&PM, 1999. p. 61. (Coleção ‘L&PM Pocket’; v. 165)
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