Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 14 de agosto de 2018

Emil de Castro - Ser Poema

A realidade confrange o poema, ao se expressar hedionda e desumana, a exemplo de quando a fome grassa, aqui como alhures, enquanto outros abundam à força de extorsões e ganâncias, fazendo a apologia do “mercado” – essa entidade que a tudo reduz em cifras e cifras.

 

Não há transparência e inteireza na apreciação do belo, na absorção da poesia que das coisas do mundo provêm, quando em paragens desse mesmo mundo se encontram, lado a lado, o luxo e a favela, a exploração e o tradicionalismo reacionário, a mendicância e a politicalha. Se a sociedade acha-se doente, como ou quando se poderá usufruir de poesia saudável, em seu legítimo estado?!

 

J.A.R. – H.C.

 

Emil de Castro

(n. 1941)

 

Ser Poema

 

Ah impossível ser somente vento

nas ruas.

Um sentido de mar no cais

com a ilha na carne.

 

Ah impossível ser pássaro

passeando plumas na calçada.

Um mastigar verde nas retinas

com o mundo na janela.

 

Ah impossível ser poema

com tanta gente morrendo.

 

Em: “O Relógio e o Sono” (1969)

 

Volteios ao Fim da Tarde

(Jackie Noonan: pintora canadense)

 

Referência:

 

CASTRO, Emil de. Ser poema. In: __________. 50 poemas escolhidos pelo autor. Rio de Janeiro, RJ: Edições Galo Branco, 2003. p. 70. (Coleção ‘50 poemas escolhidos pelo autor’; v. 6)

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