Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Dora Ferreira da Silva - Ulisses e o Inseto

A poetisa arranjou um jeito fácil de parar a leitura da ciclópica obra do irlandês James Joyce: bastou que um inseto pousasse no livro aberto, arrastado pelo vento que soprou sobre as areias da praia. E olha que parou a uma distância considerável do fim do romance: se o tomo vai à ordem das mil páginas, Dora, como afirma, mal passou de duzentas.

 

Num dos versos do poema, afirma-se que o mar sequer conseguia aplacar os nossos “dédalos” e, é claro, aqui há – além do efeito denotativo do verbete, a significar “confusões” ou “complicações”, resultantes provavelmente da concepção labiríntica da narrativa, capaz de dificultar o pleno entendimento dos objetivos colimados pelo autor – uma alusão ao alterego literário do próprio Joyce, Stephen Dedalus, cujo sobrenome foi tomado à figura mitológica grega.

 

J.A.R. – H.C.

 

Dora Ferreira da Silva

(1918-2006)

 

Ulisses e o Inseto

 

Quando li o Ulisses de Joyce

o verão era pungente

e as questões.

Nem a rede embalava

nem o mar aplacava

nossos dédalos.

O vento soprou as areias e então

 

um inseto pousou no livro

aberto ao meio:

olhitos facetados fitaram-me e foi quando

a leitura findou

na página duzentos e tanto...

 

Em: “Jardins (esconderijos)” (1979)

 

A Leitora

(Frank W. Benson: pintor norte-americano)

 

Referência:

 

FERREIRA DA SILVA, Dora. Ulisses e o inseto. In: __________. Poesia reunida. Rio de Janeiro, RJ: Topbooks, 1999. p. 151.

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