O belo poema abaixo,
de autoria do poeta turco Nazim Hikmet, foi traduzido ao castelhano pelo poeta
espanhol Antonio Gamoneda, de onde o verti ao português. Para os que
apreciariam vê-lo no original, este endereço na internet o
apresenta (“Don Kisot”, 1947), assim como muitos outros poemas de Hikmet.
Ao receber o prêmio
Cervantes, em 2006, durante a cerimônia de premiação, em presença do rei de
Espanha, Gamoneda manifestou o seu grande apreço e respeito por Hikmet –
bastante conhecido como o “comunista (ou revolucionário) romântico” –, tendo
recitado o poema em questão a toda a audiência.
J.A.R. – H.C.
Nazım Hikmet
(1902-1963)
Don Quijote
El Caballero de la Eterna Juventud
obedeció, hacia la cincuentena,
a la verdad que latia en su corazón.
Partió una bella manana de julio
para conquistar lo bello, lo verdadero
y lo justo.
Delante de él estaba el mundo
con sus gigantes abyectos,
y bajo él estaba Rocinante,
triste y heroico.
Yo sé
que una vez que se cae en esta pasión
y que se tiene un corazón de un peso
respetable,
no hay nada que hacer, Don Quijote,
nada que hacer:
hay que embestir a los molinos de
viento.
Tú tienes razón:
Dulcinea es la mujer más bella del
mundo.
Cierto que habría que gritar esto mismo
en el rostro de los grandes mercaderes;
cierto que ellos se pondrían sobre ti
y te molerían a golpes.
Pero tú eres el invencible Caballero de
la Sed.
Tú continuarás viviendo como una llama
en tu áspera armadura de hierro
y Dulcinea será cada dia más hermosa.
En: “Mudanzas” [1961-2003] / “Nazim
Hikmet” [1961]
Dom Quixote e Sancho
(Alexandre-Gabriel
Decamps: pintor francês)
Dom Quixote
O Cavaleiro da Eterna Juventude
obedeceu, até os cinquenta anos,
à verdade que pulsava em seu coração.
Partiu numa bela manhã de julho
para conquistar o belo, o verdadeiro e
o justo.
Diante dele estava o mundo
com seus gigantes abjetos,
e sob ele estava Rocinante,
triste e heroico.
Sei
que uma vez que se cai nessa paixão
e que se tem um coração de um peso
respeitável,
não a nada que fazer, Dom Quixote,
nada que fazer:
há que se investir sobre os moinhos de
vento.
Tens razão:
Dulcineia é a mulher mais bela do
mundo.
Sem dúvida que haverias de gritar isso
mesmo
no rosto dos grandes mercadores:
sem dúvida que eles arremeteriam sobre
ti
e te esmagariam a golpes.
Porém tu és o invencível Cavaleiro
Sedento.
Continuarás vivendo como uma chama
em tua áspera armadura de ferro
e Dulcineia será cada dia mais formosa.
Em: “Mudanças” [1961-2003] / “Nazim
Hikmet” [1961]
Antonio Gamoneda
(n. 1931)
Referência:
GAMONEDA, Antonio. Don Quijote. In:
__________. Poesía reunida: 1947-2004. Barcelona, ES: Galaxia Gutenberg;
Círculo de Lectores, 2010. p. 525-526.
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