Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 1 de julho de 2018

Eugenio Montale - As Palavras ‎

Assim como Octavio Paz o faz, Montale considera as palavras como meretrizes a se oferecerem à pronúncia ou à escrita de qualquer um, embora haja aquelas que remanescem esquecidas no mais incógnito dos dicionários – até que um “marrão resolva desenterrar as trufas mais fedorentas e mais raras”.

 

Se o poema permitisse atualização, as teclas da máquina de datilografar Olivetti poderiam agora ser comparadas às de um micro, notebook ou tablet, de onde emana a poesia encerrada nas palavras que o poeta seleciona ao idioma para transformar a realidade à volta – memória, emoções, pensamentos, ruídos, objetos e paragens da natureza – no mais puro êxtase.

 

J.A.R. – H.C.

 

Eugenio Montale

(1896-1981)

 

Le Parole

 

Le parole

se si ridestano

rifiutano la sede

più propizia, la carta

di Fabriano, l’inchiostro

di china, la cartella

di cuoio o di velluto

che le tenga in segreto;

 

le parole

quando si svegliano

si adagiano sul retro

delle fatture, sui margini

dei bollettini del lotto,

sulle partecipazioni

matrimoniali o di lutto;

 

le parole

non chiedono di meglio

che l’imbroglio dei tasti

nell’Olivetti portatile,

che il buio dei taschini

del panciotto, che il fondo

del cestino, ridottevi

in pallottole;

 

le parole

non sono affatto felici

di essere buttate fuori

come zambrocche e accolte

con furore di plausi e

disonore;

 

le parole

preferiscono il sonno

nella bottiglia al ludibrio

di essere lette, vendute,

imbalsamate, ibernate;

 

le parole

sono di tutti e invano

si celano nei dizionari

perché c’è sempre il marrano

che dissotterra i tartufi

più puzzolenti e più rari;

 

le parole

dopo un’eterna attesa

rinunziano alla speranza

di essere pronunziate

una volta per tutte

e poi morire

con chi le ha possedute.

 

Significado

(Curtis Verdun: pintor norte-americano)

 

As Palavras

 

As palavras

se se reanimam

recusam a base

mais propícia, o papel

de Fabriano, a tinta

nanquim, a pasta

de couro ou de veludo

que as guarde em segredo;

 

as palavras

quando se despertam

se ajeitam no verso

das faturas, nas margens

dos bilhetes de loto,

sobre os convites

para casamento ou enterro;

 

as palavras

não pedem mais do que

a confusão das teclas

da Olivetti portátil,

do que a escuridão dos bolsos

do colete, do que o fundo

das cestas de papéis, reduzidas

a bolinhas;

 

as palavras

não ficam nada contentes

de serem postas para fora

como meretrizes e acolhidas

com o furor de aplausos

e desonra;

 

as palavras

preferem o sono

na garrafa fechada ao ludíbrio

de serem lidas, vendidas,

embalsamadas, hibernadas;

 

as palavras

são de todos e em vão

se ocultam nos dicionários

porque há sempre o marrão

que desenterra as trufas

mais fedorentas e mais raras;

 

as palavras

após uma espera eterna

renunciam à esperança

de serem pronunciadas

de uma vez por todas

e de morrerem depois

com quem as possuiu.

 

Referência:

 

MONTALE, Eugenio. Le parole / As palavras. Tradução de Geraldo Holanda Cavalcanti. In: __________. Poesias. Edição bilíngue. Seleção, tradução e notas de Geraldo Holanda Cavalcanti. Prefácio de Luciana Stegagno Picchio. Rio de Janeiro, RJ: Record, 1997. Em italiano: 150 e 152; em português: p. 151 e 153.

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