O poema, cujo título
se atribui ao presente mês de julho, faz-nos lembrar dos derradeiros e
sangrentos eventos da Revolução Francesa, que em 9 de Thermidor – isto é, 27 de
julho de 1794 – experimentou os últimos espasmos da Fase do Terror, com a
detenção de Robespierre – logo sem seguida decapitado – e outros
revolucionários. Consigne-se, por oportuno, que Thermidor era um mês do
calendário francês que mediava entre julho e agosto.
Talvez tenha ido
longe demais na menção histórica. Afinal, o texto de Coppée expõe, em primeiro
plano, a situação do sujeito lírico, a extravasar a bile e o sangue em
decorrência de um amor torturado, para o qual se indicaria, como drástico
remédio, a cisão de um sonho tão duradouramente alimentado.
J.A.R. – H.C.
François Coppée
(1842-1908)
Juillet
Le ciel flambe et la terre fume,
La caille frémit dans le blé;
Et, par un spleen lourd accablé,
Je dévore mon amertume.
Sous l’implacable Thermidor
Souffre la nature immobile;
Et dans le regret et la bile
Mon chagrin s’aigrit plus encor.
Crève donc, cœur trop gonflé, crève,
Cœur sans courage et sans raison,
Qui ne peux vomir ton poison
Et ne peux oublier ton rêve!
Par cet insultant jour d’été,
Cœur torturé d’amour, éclate!
Et que, de ta fange écarlate
Me voyant tout ensanglanté,
Ainsi que l’apostat antique,
Avec un blasphème impuissant,
Je jette à pleines mains mon sang
A ce grand soleil ironique!
Folhas vermelhas e mar
(Lisa Ballard: pintora norte-irlandesa)
Julho
Fulge o azul, fumega o chão,
Mexe a codorna no trigo,
Sob o “spleen” – bronco inimigo –
Devoro a minha aflição.
Geme inerte a natureza
No implacável Thermidor;
Mais se aguça o meu rancor
Na saudade e na tristeza.
Coração – antes morrer,
Já que não podes, ao menos,
Vomitar os teus venenos,
Nem teus sonhos esquecer.
Formoso dia insolente!
Coração, estoura, enfim!
E que eu inundado, assim,
No teu sangue rubro e quente,
Como o apóstata da Cruz,
Em torva blasfêmia exangue,
Lance, às mãos cheias, meu sangue
As ironias da luz!
(11 de maio de 1881)
Referência:
COPPÉE, François.
Juin / Junho. Tradução de Raimundo Correia e Valentim Magalhães. In: __________. Poesias
completas de Raimundo Correia. Vol. II. Organização, prefácio e notas de
Múcio Leão. São Paulo, SP: Companhia Editora Nacional, 1948. Em francês: p.
452-453; em português: p. 378.
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