Com
um título semelhante ao de um dos melhores poemas do maranhense Ferreira Gullar,
este poema é também perpassado pela ideia de que entramos em contato com uma
pilha de imundícies, sobretudo em relação ao que comemos, o que nos leva a
sermos, pelo menos no plano físico, algo digno de repugnância.
Tudo
se mistura nesse jogo relacional do sexo, no beijo afrancesado de línguas com
plena troca de fluidos, nessa mixórdia de alimentos nada saudáveis, carregados
de agrotóxicos, nessa alimentação ‘fast-food’ que somente faz bem aos bolsos
dos gestores das grandes cadeias instaladas no mundo todo. Assim, sob a
soberania da propaganda, somos capazes de dar a vida por um hambúrguer ou coisa
que o valha...
J.A.R.
– H.C.
John Drury
(n. 1950)
Dirty
Poem
Whoever
worships cleanliness
dwells
in the canton of exclusion,
where
the church walls inside are white-washed
and
the dogs muzzled, the streets empty
after
curfew, where crucifixes
are
swaddled in gauze, and only soap
rendered
from volcanic ash can scrape
the
oils and smears and deep grit of earth.
But
down a red stairwell, through curtains of beads,
a
singer’s nipples glow through lace.
Lovers
rub lotions over aching blades.
Coupling,
they also love
the
delectable mess of sex,
the
jolt of voltage, confluence
like
the clear and muddy blending
of
Potomac and Shenandoah.
Mix
thoroughly – the earth tones, earthiness,
pecks
of dirt you’ll eat before your death,
the
earth that hugs you or the flames
that
make you wail. Oh, body
of
flesh and fluids. Oh, soul that revels there,
we
die for the French kiss of everything.
Oh,
pure impurity: the fleck
of
dust at the heart of each snowflake.
Romãs e outras frutas
numa paisagem
(Abraham Brueghel: pintor flamengo)
Poema
Sujo
Quem
preza pela limpeza
habita
o cantão da exclusão,
onde
as paredes interiores da igreja são caiadas de branco,
empregam-se
mordaças nos cães e as ruas ficam desertas
depois
do toque de recolher; onde os crucifixos
estão
envoltos em bandagens, e apenas o sabão
processado
a partir de cinzas vulcânicas é capaz de remover
as
gorduras, as nódoas e o grés profundo da terra.
Mas
em descida por uma escada vermelha, cruzando cortinas de contas,
os
mamilos de uma cantora brilham por trás da renda.
Os
amantes untam com loções as espáduas doloridas.
Copulando,
também adoram
o
delicioso desalinho do sexo,
a
irrupção da voltagem, a confluência
que
nem a do claro e do lodoso na junção
do
Potomac com o Shenandoah.
Misture
bem – os tons da terra, a terrosidade,
as
pilhas de imundície que você comerá antes de morrer,
a
terra que lhe abraça ou as chamas
que
lhe fazem gemer. Oh, corpo
de
carne e fluidos. Oh alma que aí se deleita,
somos
capazes de morrer pelo beijo francês de qualquer coisa.
Oh
pura impureza: a mancha
de
poeira no coração de cada floco de neve.
Referência:
DRURY,
John. Dirty poem. In: __________. Burning the Aspern papers.
Oxford, OH: Miami University Press, 2003, p. 19.
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