Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 26 de julho de 2018

John Drury - Poema Sujo ‎

Com um título semelhante ao de um dos melhores poemas do maranhense Ferreira Gullar, este poema é também perpassado pela ideia de que entramos em contato com uma pilha de imundícies, sobretudo em relação ao que comemos, o que nos leva a sermos, pelo menos no plano físico, algo digno de repugnância.

 

Tudo se mistura nesse jogo relacional do sexo, no beijo afrancesado de línguas com plena troca de fluidos, nessa mixórdia de alimentos nada saudáveis, carregados de agrotóxicos, nessa alimentação ‘fast-food’ que somente faz bem aos bolsos dos gestores das grandes cadeias instaladas no mundo todo. Assim, sob a soberania da propaganda, somos capazes de dar a vida por um hambúrguer ou coisa que o valha...

 

J.A.R. – H.C.

 

John Drury

(n. 1950)

 

Dirty Poem

 

Whoever worships cleanliness

dwells in the canton of exclusion,

where the church walls inside are white-washed

and the dogs muzzled, the streets empty

after curfew, where crucifixes

are swaddled in gauze, and only soap

rendered from volcanic ash can scrape

the oils and smears and deep grit of earth.

 

But down a red stairwell, through curtains of beads,

a singer’s nipples glow through lace.

Lovers rub lotions over aching blades.

Coupling, they also love

the delectable mess of sex,

the jolt of voltage, confluence

like the clear and muddy blending

of Potomac and Shenandoah.

 

Mix thoroughly – the earth tones, earthiness,

pecks of dirt you’ll eat before your death,

the earth that hugs you or the flames

that make you wail. Oh, body

of flesh and fluids. Oh, soul that revels there,

we die for the French kiss of everything.

Oh, pure impurity: the fleck

of dust at the heart of each snowflake.

 

Romãs e outras frutas

numa paisagem

(Abraham Brueghel: pintor flamengo)

 

Poema Sujo

 

Quem preza pela limpeza

habita o cantão da exclusão,

onde as paredes interiores da igreja são caiadas de branco,

empregam-se mordaças nos cães e as ruas ficam desertas

depois do toque de recolher; onde os crucifixos

estão envoltos em bandagens, e apenas o sabão

processado a partir de cinzas vulcânicas é capaz de remover

as gorduras, as nódoas e o grés profundo da terra.

 

Mas em descida por uma escada vermelha, cruzando cortinas de contas,

os mamilos de uma cantora brilham por trás da renda.

Os amantes untam com loções as espáduas doloridas.

Copulando, também adoram

o delicioso desalinho do sexo,

a irrupção da voltagem, a confluência

que nem a do claro e do lodoso na junção

do Potomac com o Shenandoah.

 

Misture bem – os tons da terra, a terrosidade,

as pilhas de imundície que você comerá antes de morrer,

a terra que lhe abraça ou as chamas

que lhe fazem gemer. Oh, corpo

de carne e fluidos. Oh alma que aí se deleita,

somos capazes de morrer pelo beijo francês de qualquer coisa.

Oh pura impureza: a mancha

de poeira no coração de cada floco de neve.

 

Referência:

 

DRURY, John. Dirty poem. In: __________. Burning the Aspern papers. Oxford, OH: Miami University Press, 2003, p. 19.

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