Shivdasani, poetisa
indiana, fala com denodo e honestidade, do que representa ser mulher em seu
país, expondo suas próprias ansiedades e desconsolos: ecos insinuantes de
sujeição e autoquestionamentos são ouvidos em meio à metapoética do poema,
brotando da dor que, cativa na alma, jorra livre em seus versos.
Há bastante vermelho
no dia do casamento de uma mulher no dharma hindu, desde o pó que se coloca na
divisão principal do cabelo, até a marca na testa e o sári que é empregado na
cerimônia: presumivelmente Shivdasani esteja a tomá-lo como uma metáfora
alusiva à manutenção das mulheres sob o domínio das tradicionais estruturas
conjugais indianas.
J.A.R. – H.C.
Menka Shivdasani
(n. 1961)
Epitaph
The thing to do
is feel the texture of the page
still white before the lines form,
touch the smoothness of the skin,
refined unlike the bark
once peeled away.
The trouble is,
we do not wear white
on the wedding day.
My religion calls for blood,
redness draped across the eyes,
wrapped tight around the skin.
But lines form anyway,
alphabets rounded like shoulders
or flat as hair upon the arm.
The story begins like a wrinkle on the face
and does not end
when the wrinkles freeze.
But that is when the surface
turns to white and I hold my pain
in its plastic tube,
let the fluid fall.
That’s when the poem writes itself
like an epitaph.
Mulher sentada com
relógio de pulso
(Picasso: pintor espanhol)
Epitáfio
A coisa a fazer
é sentir a textura da página
ainda branca antes da forma das linhas,
tocar a suavidade delicada
da pele, distintamente da tez
uma vez descamada.
O problema é que
não usamos branco
no dia do casamento.
Minha religião exige sangue,
drapejado carmesim entre os olhos,
bem aplicado à volta da pele.
Contudo as linhas se formam de qualquer modo,
alfabetos arredondados como ombros
ou planos como o cabelo sobre o braço.
A história começa como uma ruga no rosto
e não termina
no momento em que elas estancam.
Mas é quando a superfície
torna-se branca e confino minha dor
em seu tubo de plástico,
que deixo o fluido escorrer.
Nesse instante o poema se autocompõe
como um epitáfio.
Referência:
SHIVDASANI, Menka. Epitaph. In:
THAYIL, Jeet (Ed.). 60 indian poets. New Delhi, IN: Penguin Books
India, 2008. p. 267.
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