Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 14 de maio de 2018

Khalil Gibran - A Beleza ‎

O poeta dirige-se a um povo provavelmente imaginário – o de Orfalese –, muito embora se possa conceber que esteja a se referir a um povo específico – quem sabe o libanês? –, para lhe falar sobre assuntos diversos que invadem o espírito humano, como a liberdade, o trabalho, a amizade, a morte e outros.

O excerto a seguir diz respeito ao pronunciamento do profeta sobre a beleza, ela que não é uma carência ou necessidade, senão um êxtase a ocorrer entre a eternidade e o espelho, e somos quer um quer o outro, sacrossantas e angelicais almas a planar sobre um jardim em flor.

J.A.R. – H.C.

Khalil Gibran
(1883-1931)

A Beleza

E um poeta disse: Fala-nos da Beleza.
E ele respondeu:
Onde buscareis a beleza, e como a
encontrareis, a não ser que ela seja vosso
caminho e vosso guia?
E como falareis dela, a não ser que
ela teça vosso falar?

Os aflitos e os feridos dizem: “A
beleza é bondosa e gentil.
Como uma mãe, meio envergonhada
de sua própria glória, ela caminha entre
nós”.

E os apaixonados dizem: “Não, a
beleza é uma coisa de poder e horror.
Como a tempestade, ela sacode a
terra abaixo de nós e o céu acima”.

Os cansados e extenuados dizem:
“A beleza murmura docemente. Ela fala
ao nosso espírito.
Sua voz ilumina nossos silêncios
como a fraca luz que tremula no medo
da escuridão”.

Mas os incansáveis dizem: “Nós a
ouvimos gritar entre as montanhas.
E com seus gritos, vieram os sons
dos cascos, e o bater das asas e o rugir
dos leões”.

À noite, os sentinelas da cidade
dizem: “A beleza surgirá com a aurora
do leste”.

E ao meio-dia, os trabalhadores e
os caminhantes dizem: “Nós a vimos
inclinando-se sobre a terra pelas janelas
do crepúsculo”.

No inverno, dizem os que estão cobertos
de neve: “Ela virá com a primavera,
saltitando sobre as colinas”.

E no calor do verão, os camponeses
na colheita dizem: “Nós a vimos dançando
com as folhas do outono, e vimos neve
em seu cabelo”.

Todas estas coisas dissestes da beleza.
Mas, na verdade, só falastes dela as
necessidades não satisfeitas, e a beleza não
é uma necessidade, mas sim um êxtase.

Não é uma boca que tem sede, nem uma
mão vazia estendida para frente, mas um
coração inflamado e uma alma encantada.

Não é a imagem que veríeis, nem a canção
que ouviríeis, mas uma imagem que vedes,
apesar de vossos olhos estarem fechados,
e uma canção que ouvíeis, apesar de vossos
ouvidos estarem surdos.

Não é a seiva dentro da casca sulcada,
nem uma asa ligada a uma garra, mas um
jardim sempre em flor e um bando de anjos
sempre em voo.

Povo de Orfalese, a beleza é vida quando
a vida revela sua face sagrada.
Mas vós sois a vida e vós sois o véu.
A beleza é a eternidade mirando-se
num espelho.
Mas vós sois eternidade e vós sois o espelho.

Lendo à Janela
(Charles James Lewis: pintor inglês)

Referência:

GIBRAN, Khalil. E um poeta disse: fala-nos da beleza. Tradução de Bettina Gertrum Becker. In: __________. O profeta. Tradução de Bettina Gertrum Becker. Porto Alegre, RS: L&PM, 2011. p. 94-97. (Coleção “L&PM Pocket”; v. 222).

Nenhum comentário:

Postar um comentário