Um livro é aquela força irresistível capaz de levar o leitor para mundos
distantes, quer no plano espacial quer no temporal. Ou, ainda, nos manter com
os pés firmes onde estamos, para alterar o estado contemporâneo das coisas,
dado o poder revolucionário das ideias que veicula.
Obviamente que o livro não tem a força de atingir as massas – em especial,
em lugares onde o seu preço é proibitivo, como no Brasil, de um povo muito mais
mal informado e manipulado pela grande mídia do que instruído! –, mas ele tem
um atributo que o torna indispensável: obriga o seu autor a ser suficientemente
convincente em sua exposição, pois, do contrário, o leitor simplesmente pode
afastá-lo da sua frente, optando por outra obra mais equilibrada em termos de
texto e assunto.
Para quem assiste a programas televisivos, isso é possível? Claro que
não: ao mudar de canal, o telespectador defrontar-se-á com o mesmo lixo
parametrizado que nos é oferecido – ou mesmo vendido –, sem direito de opção a
outros cardápios que respeitem a sua inteligência!
J.A.R. – H.C.
Pablo Neruda
(1904-1973)
Ode al Libro (II)
Libro
hermoso,
libro,
mínimo bosque,
hoja
tras hoja,
huele
tu papel
a elemento,
eres
matutino y nocturno,
cereal,
oceánico,
en tus antiguas
páginas
cazadores de osos,
fogatas
cerca del
Mississippi,
canoas
en las islas,
más tarde
caminos
y caminos,
revelaciones,
pueblos
insurgentes,
Rimbaud como un
herido
pez sangriento
palpitando en el
lodo,
y la hermosura
de la fraternidad,
piedra por piedra
sube el castillo
humano,
dolores que
entretejen
la firmeza,
acciones solidarias,
libro
oculto
de bolsillo
en bolsillo,
lámpara
clandestina,
estrella roja.
Nosotros
los poetas
caminantes
exploramos
el mundo,
en cada puerta
nos recibió la vida,
participamos
en la lucha
terrestre.
Cuál fue nuestra
victoria?
Un libro,
un libro lleno
de contactos humanos,
de camisas,
un libro
sin soledad, con
hombres
y herramientas,
un libro
es la victoria.
Vive y cae
como todos los
frutos,
no sólo tiene luz,
no sólo tiene
sombra,
se apaga,
se deshoja,
se pierde
entre las calles,
se desploma en la
tierra.
Libro de poesía
de mañana,
otra vez
vuelve
a tener nieve o musgo
en tus páginas
para que las pisadas
o los ojos
vayan grabando
huellas:
de nuevo
descríbenos el mundo
los manantiales
entre la espesura,
las altas arboledas,
los planetas
polares,
y el hombre
en los caminos,
en los nuevos
caminos,
avanzando
en la selva,
en el agua,
en el cielo,
en la desnuda soledad
marina,
el hombre
descubriendo
los últimos secretos,
el hombre
regresando
con un libro,
el cazador de vuelta
con un libro,
el campesino
arando
con un libro.
En: “Odas Elementales” (1954)
O Monstro Marinho
(Su Blackwell:
artista inglesa)
Ode ao Livro (II)
Livro
belo,
livro,
mínimo bosque,
folha
após folha,
cheira
teu papel
a elemento,
és
matutino e noturno,
cereal,
oceânico,
em tuas antigas
páginas
caçadores de ossos,
fogueiras
próximas ao
Mississipi,
canoas
nas ilhas,
mais tarde
caminhos
e caminhos,
revelações,
povos
insurgentes,
Rimbaud como um
ferido
peixe sangrento
palpitando no lodo,
e a beleza
da fraternidade,
pedra por pedra
sobe o castelo humano
dores que entretecem
a firmeza,
ações solidárias,
livro
oculto
de bolso
em bolso,
lâmpada
clandestina,
estrela vermelha.
Nós
os poetas
caminhantes
exploramos
o mundo,
em cada porta
a vida nos recebeu,
participamos
na luta terrestre.
Qual foi nossa
vitória?
Um livro,
um livro cheio
de contatos humanos,
de camisas,
um livro
sem solidão, com
homens
e ferramentas,
um livro
é a vitória.
Vive e cai
como todos os frutos,
não só tem luz,
não só tem
sombra,
apaga-se
desfolha-se,
perde-se
entre as ruas,
implode-se na terra.
Livro de poesia
de manhã,
outra vez
volta
a ter neve ou musgo
em tuas páginas
para que os passos
ou os olhos
deixem
vestígios:
de novo
descreve-nos o mundo,
os mananciais
entre a espessura,
os altos bosques,
os planetas
polares,
e o homem
nos caminhos,
nos novos caminhos,
avançando
na selva,
na água,
no céu,
na nua solidão marinha,
o homem
descobrindo
os últimos segredos,
o homem
regressando
com um livro,
o caçador de volta
com um livro,
o camponês
arando
com um livro.
Em: “Odes Elementares” (1954)
Referência:
NERUDA, Pablo. Ode al libro (II). In:
CASANOVA, José Francisco Ruiz (Selección y introducción). Antología cátedra de poesía de las letras hispánicas. 11. ed.
Madrid, ES: Ediciones Cátedra (Grupo Anaya S.A.), 2014. p. 869-872.
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