Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 18 de março de 2018

André Spire - Pobres...

Dirigindo-se aos pobres, aos ricos, às mulheres e às crianças, o poeta enfatiza algum aspecto que se terá revelado em seu convívio com tais categorias sociais: com a mendicidade, no primeiro caso; com a empáfia, no segundo; com a frivolidade, no terceiro; e com a urgência de atenção, no derradeiro.

Com respeito aos pobres, aos ricos e às mulheres, Spire conjuga o verbo “amar” no passado, talvez julgando que não há muito que se possa fazer para “emendar o soneto”. Quanto às crianças, fica a esperança de, sendo amadas e bem educadas, aprimorem o mundo de suas mazelas.

J.A.R. – H.C.

André Spire
(1868-1966)

Il y a

Pauvres,
Qu’est-ce que j’ai à vous dire?
Je vous aimais.
Mes livres, mon Dieu, m’avaient parlé de vous.
Je suis parti vers vous pour vous porter ma force.
Mais j’ai vu vos dos ronds, vos genoux arqués,
Vos yeux de chien battu qui guettaient ma main.
Qu’est-ce que j’ai à vous dire?
Il y a votre paume creuse entre nous.

Riches,
Qu’est-ce que j’ai à vous dire?
Je vous aimais.
Mes poètes, mes peintres m’avaient parlé de vous.
Je suis parti pour vous porter mes chants.
J’ai vu vos cols glacés sur vos cous raides,
Et vos yeux qui guettaient ma main,
Ma main trop peu obéissante.
Qu’est-ce que j’ai à vous dire?
Il y a vos yeux vides entre nous.

Femmes,
Qu’est-ce que j’ai à vous dire?
Je vous aimais.
Je suis parti pour vous porter mon front.
Vous causiez avec votre corsetière.
Vous avez promené un tube sur vos lèvres,
Et vos yeux n’ont pas vu ma main,
Ma main tremblante.
Femmes,
Qu’est-ce que j’ai à vous dire?
Il y a trop de rouge gras entre nous.

Enfants,
Qu’est-ce que j’ai à vous dire?
Je ne suis pas parti vers vous.
Aucun de vous n’a fatigué mes bras ni mes genoux.
Aucun de vous n’a détourné ma main qui écrivait
Et n’a jeté de l’encre sur ma page.
Enfants, petits enfants,
Qu’est-ce que j’ai à vous dire?
Il y a trop de baisers, pas donnés, entre nous.

(Novembre 1911)

Caridade aos Pobres
(Robert Kemm: pintor inglês)

Pobres...

Pobres,
que vos hei de dizer?
Eu vos amava.
Meus livros e meu Deus falaram-me de vós.
Saí a vosso encontro para levar-vos meu amparo,
mas deparei com vossos torsos curvos,
vossos joelhos dobrados,
vossos olhares de cães batidos atentos às minhas mãos.
Que vos hei de dizer?
Há entre nós a vossa mão, pedindo...

Ricos,
que vos hei de dizer?
Eu vos amava.
Meus poetas e meus pintores falaram-me de vós.
Saí a vosso encontro para levar-vos os meus cantos,
mas vos achei de colarinho duro,
duros também e arrogantes,
desconfiados de minhas mãos pouco obedientes.
Que vos hei de dizer?
Há entre nós o vazio de vossos olhos...

Mulheres,
que vos hei de dizer?
Eu vos amava.
Saí a vosso encontro carregado de amor,
mas vos achei com as vossas costureiras
e vos enchendo os lábios de batom.
Vossos olhos não viram minhas mãos,
minhas mãos trêmulas.
Mulheres,
Que vos hei de dizer?
rouge demais entre nós...

Crianças,
que vos hei de dizer?
Não corri ao vosso encontro,
nenhuma de vós cansou-me os braços e os joelhos,
nenhuma de vós desviou a mão que escrevia
nem jogou tinta no meu papel.
Crianças, criancinhas,
que vos hei de dizer?
Há entre nós todos os beijos que não dei...

(Novembro 1911)

Referências:

Em Francês

SPIRE, André. Il y a. In: __________. Le secret. Paris, FR: NRF – Nouvelle Revue Française & Gallimard, 1919. p. 94-96.

Em Português

SPIRE, André. Pobres... Tradução de Sérgio Milliet. In: MILLIET, Sérgio (Seleção e Notas). Obras-primas da poesia universal. 3. ed. São Paulo, SP: Livraria Martins Editora, 1957. p. 221-222.

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