Dirigindo-se aos pobres, aos ricos, às mulheres e às crianças, o poeta
enfatiza algum aspecto que se terá revelado em seu convívio com tais categorias
sociais: com a mendicidade, no primeiro caso; com a empáfia, no segundo; com a
frivolidade, no terceiro; e com a urgência de atenção, no derradeiro.
Com respeito aos pobres, aos ricos e às mulheres, Spire conjuga o verbo “amar”
no passado, talvez julgando que não há muito que se possa fazer para “emendar o
soneto”. Quanto às crianças, fica a esperança de, sendo amadas e bem educadas, aprimorem
o mundo de suas mazelas.
J.A.R. – H.C.
André Spire
(1868-1966)
Il y a
Pauvres,
Qu’est-ce que j’ai à
vous dire?
Je vous aimais.
Mes livres, mon Dieu,
m’avaient parlé de vous.
Je suis parti vers
vous pour vous porter ma force.
Mais j’ai vu vos dos
ronds, vos genoux arqués,
Vos yeux de chien
battu qui guettaient ma main.
Qu’est-ce que j’ai à
vous dire?
Il y a votre paume
creuse entre nous.
Riches,
Qu’est-ce que j’ai à
vous dire?
Je vous aimais.
Mes poètes, mes
peintres m’avaient parlé de vous.
Je suis parti pour
vous porter mes chants.
J’ai vu vos cols
glacés sur vos cous raides,
Et vos yeux qui
guettaient ma main,
Ma main trop peu
obéissante.
Qu’est-ce que j’ai à
vous dire?
Il y a vos yeux vides
entre nous.
Femmes,
Qu’est-ce que j’ai à
vous dire?
Je vous aimais.
Je suis parti pour
vous porter mon front.
Vous causiez avec
votre corsetière.
Vous avez promené un
tube sur vos lèvres,
Et vos yeux n’ont pas
vu ma main,
Ma main tremblante.
Femmes,
Qu’est-ce que j’ai à
vous dire?
Il y a trop de rouge
gras entre nous.
Enfants,
Qu’est-ce que j’ai à
vous dire?
Je ne suis pas parti
vers vous.
Aucun de vous n’a
fatigué mes bras ni mes genoux.
Aucun de vous n’a
détourné ma main qui écrivait
Et n’a jeté de l’encre
sur ma page.
Enfants, petits
enfants,
Qu’est-ce que j’ai à
vous dire?
Il y a trop de
baisers, pas donnés, entre nous.
(Novembre 1911)
Caridade aos Pobres
(Robert Kemm: pintor
inglês)
Pobres...
Pobres,
que vos hei de dizer?
Eu vos amava.
Meus livros e meu
Deus falaram-me de vós.
Saí a vosso encontro
para levar-vos meu amparo,
mas deparei com
vossos torsos curvos,
vossos joelhos
dobrados,
vossos olhares de
cães batidos atentos às minhas mãos.
Que vos hei de dizer?
Há entre nós a vossa
mão, pedindo...
Ricos,
que vos hei de dizer?
Eu vos amava.
Meus poetas e meus
pintores falaram-me de vós.
Saí a vosso encontro
para levar-vos os meus cantos,
mas vos achei de
colarinho duro,
duros também e
arrogantes,
desconfiados de
minhas mãos pouco obedientes.
Que vos hei de dizer?
Há entre nós o vazio
de vossos olhos...
Mulheres,
que vos hei de dizer?
Eu vos amava.
Saí a vosso encontro
carregado de amor,
mas vos achei com as
vossas costureiras
e vos enchendo os
lábios de batom.
Vossos olhos não
viram minhas mãos,
minhas mãos trêmulas.
Mulheres,
Que vos hei de dizer?
Há rouge demais entre nós...
Crianças,
que vos hei de dizer?
Não corri ao vosso
encontro,
nenhuma de vós
cansou-me os braços e os joelhos,
nenhuma de vós
desviou a mão que escrevia
nem jogou tinta no
meu papel.
Crianças,
criancinhas,
que vos hei de dizer?
Há entre nós todos os
beijos que não dei...
(Novembro 1911)
Referências:
Em Francês
SPIRE, André. Il y a. In: __________. Le secret. Paris, FR: NRF – Nouvelle
Revue Française & Gallimard, 1919. p. 94-96.
Em Português
SPIRE, André. Pobres... Tradução de
Sérgio Milliet. In: MILLIET, Sérgio (Seleção e Notas). Obras-primas da poesia universal. 3. ed. São Paulo, SP: Livraria
Martins Editora, 1957. p. 221-222.
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