Tudo se passa neste poema como se fossem elucubrações do pensador
romano, já em idade avançada, dirigindo-se aos jovens que mal entraram na idade
adulta, ao mesmo tempo cândidos e levianos, para falar-lhes sobre o que é o transcurso
completo da juventude à velhice, com as suas contingências e percalços.
O tema, a bem dizer, aparece em muitos escritos de Sêneca, a exemplo do
excerto a seguir, extraído da obra “Da Brevidade da Vida”, o qual traduzo
livremente da versão espanhola a que faço menção no campo de referências, ao
final desta postagem:
Os postos, os monumentos, tudo o que a
ambição impôs com seus decretos ou construiu com suas obras, rapidamente
desmorona, nada deixa de ruir e de ser removido sob o peso prolongado dos anos;
por outro lado, não se podem causar danos às coisas que a sabedoria
imortalizou; nenhuma idade as apagará, nenhuma as minimizará; a seguinte, e a
que sempre virá, logo contribuirão com algo a se venerar, haja vista que, seguramente,
a inveja está à espreita e com mais sinceridade admiramos o que está mais distante.
A vida do sábio, portanto, é muito extensa, não a cingem os mesmos limites que balizam
a vida dos demais: somente ele se libera das leis do gênero humano, todos os
séculos estão a seu serviço como a um deus. Se algo se distancia no tempo, ele
o capta com a memória; se está adiante, emprega-o; se ainda ocorrerá, antecipa-o.
Alonga-lhe a vida a reunião de todos os tempos em um só apenas. (SÉNECA, 2008,
p. 405-406)
J.A.R. – H.C.
Nestor Vítor
(1868-1932)
Confissão de Sêneca
Se vós soubésseis,
jovens orgulhosos
E iníquos, para que
serve ficar-se velho!
– Para ser o perdão
desses pecaminosos
Que condenamos... O
Conselho
Contrário aos gestos
inconsiderados
Que o desamor à vida,
o amor às atitudes
Inspira... Os
vasquejos cansados (1)
Da força cega, de
heroísmos rudes...
A conciliação
Ignóbil, quase,
Com homens e
elementos circunstantes...
A triste conformidade
Que tem por base
Desilusões às mil,
das mil ilusões de antes...
Se soubésseis que as
rugas e os gilvazes (2)
Ora podem falar, é
certo,
De um golpe recebido
em combates tenazes
E nobres, ou então de
um sofrer encoberto,
Atroz, injusto, mas
também que tantas
Delas e uns poucos
deles
Nada trazem de
origens santas,
Sim de carnais
espasmos ou daqueles
Recontros ignorados
que há na vida (3)
Do melhor dentre nós...
(Vede, ele cora
Tão somente à lembrança
sugerida
Dessas coisas agora...)
Se soubésseis, eu
digo, criaturas
Ainda um pouco incriadas,
Intatas formosuras
Afogueadas
Pela convicção falaz
do permanente,
E do completo, e do
ideal,
Que subsistir,
Inevitavelmente,
É fazer liga até com
o próprio mal,
É ceder ao que tem de
vir,
De certo aspecto,
pois, é pior que morrer;
Entediados dos
futuros anos,
Vos odiareis no que
haveis de ser,
Vos odiareis cândidos
e levianos...
(Revista “Festa”, n° 4)
Velho usando um barrete vermelho
(Gyzis Nikolaos:
pintor grego)
Elucidário:
(1) – Vasquejo: convulsão, agonia,
agitação;
(2) – Gilvaz: golpe fundo, ou cicatriz
de golpe, na face;
(3) – Recontro: embate, peleja, luta,
conflito.
Referências:
SÉNECA. Diálogos. Introducciones, traducción y notas de Juan Mariné Isidro.
1. ed., 2. reimp. Madrid, ES: Editorial Gredos, 2008.
VÍTOR, Nestor. Confissão de Sêneca. In:
__________. Prosa e poesia. Por
Tasso da Silveira. Rio de Janeiro, GB: Agir, 1963. p. 107-108. (Coleção “Nossos
Clássicos”; n. 74)
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