Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 8 de março de 2018

Gustavo Teixeira - Refúgio da Arte

Aos olhos do poeta a vida é triste, ainda que bela. E somente no refúgio da arte um pouco de azul logra firmar-se no firmamento: é que a saudade e a tristeza consomem-no e, para mitigá-las, lança ele mão da poética, com que tece versos à amada, já que não é capaz de lhe dar ouro ou gemas.

“Ostra feliz não faz pérola”, repito-o, já quase me apropriando em definitivo da máxima de Rubem Alves: pior se os versos que o poeta imagina não lhe trouxerem nenhum contentamento, tal como naquele excerto do poema “Marcha” da Cecília Meireles! Seria como a oclusão do espírito, que já não encontraria serenidade nem no diálogo interno nem nas manifestações ou fenômenos que lhe são exógenos...

J.A.R. – H.C.

Gustavo de Paula Teixeira
(1881-1937)

Refúgio da Arte

Quando a saudade me aperta
O coração que suspira,
Confio as mágoas à lira,
Boa amiga da hora incerta.

Com os olhos em névoa imersos,
Na tristeza que me invade,
Eu não domino a vontade
De tudo exprimir em versos.

E a estrofe que em meu recanto
Componho ao sol que declina,
É uma concha onde em surdina
Se ouve um murmúrio de pranto...

Ouro não tendo nem gemas
Para depor no teu colo,
Da pobreza eu me consolo
Dando-te poemas e poemas.

E na ânsia que me consome
De bordar uma obra-prima,
Na estrela d’Alva da rima
Faço brilhar o teu nome.

Com versos – apenas quatro –
Preparo a flórea moldura
Em que esplende a fronte pura
Que mais que tudo idolatro.

A vida é bela, mas triste;
Flores e espinhos reparte.
É só no refúgio da Arte
Que um pouco de azul existe.

Em: “Colar de Rimas”

A Criança Doente
(Edvard Munch: pintor norueguês)

Referência:

TEIXEIRA, Gustavo. Refúgio da arte. In: __________. Poesias completas. Prefácio de Cassiano Ricardo. São Paulo, SP: Anhambi, 1959. p. 396-397.

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