Talvez o poeta que dá título ao poema de Leal seja ele próprio – quem
diria? –, a substituir as viagens a pontos selecionados do “mapa mundi”, por
outras tantas “viagens” ao universo das letras, um borbulhante vertedouro de
palavras que tangenciam a inteligibilidade de tudo quanto existe.
Contudo, os poemas também são elaborados com imagens ininteligíveis, e
dessa forma se expressa a exuberância da “ars poetica”: na alternância entre o
objetivo e o subjetivo, entre o racional e o irracional, entre a realidade e o
sonho, entre a paisagem natural e o panorama de pensamentos, sentimentos e
emoções que, por meio dela, acabam por encontrar uma válvula de escape.
J.A.R. – H.C.
Cláudio Murilo Leal
(n. 1937)
O poeta
Trocou as viagens de
aventura, estradas, marés,
amigos feitos e
desfeitos ao sopro do vento,
por uma intimidade
maior com as palavras
através da leitura
paciente de enciclopédias.
Conseguiu livros de
edição esgotada, como
Arte Poética, Manual de Estilos,
Dicionário de Rimas;
os poemas que passou
a escrever logo depois
traíam uma erudição
mal digerida, se bem que,
do ponto de vista do
artesanato, fossem
mais bem acabados do
que as obras de juventude,
onde a ânsia de
contar todas as experiências,
esgotar as imagens,
obscurecia o poema.
Seu estilo foi-se
impondo entre os confrades
pela expressão
concisa e precisa, clássica mesmo.
Às vezes, no entanto,
invejava o tempo em que
brotava de seu
cérebro imagens ininteligíveis.
Em: “Caderno de Proust”
Retrato de Claude Monet
(Pierre Auguste Renoir:
pintor francês)
Referência:
LEAL, Cláudio Murilo. O poeta. In:
__________. Módulos: 1959-1998. Rio
de Janeiro, RJ: Sette Letras, 1998. p. 150. (Ministério da Cultura – Fundação
Biblioteca Nacional – Departamento Nacional do Livro; Universidade de Mogi das
Cruzes)
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