O poeta pensa em sua dileta que junto a ele já não se encontra, e
lembra-se, com saudade, do Natal e sua divina paz que teriam ficado com ela,
hipoteticamente em Clavadel, sanatório suíço onde se internara para tratamento
da tuberculose, quando ainda contava 27 anos.
Tudo são mágoas pela ausência. A par disso, ternura e afeto se
reproduzem nas palavras de Bandeira para denotar carência de manifestações
explicitamente carnais, eróticas, sensuais nos sentimentos que lhe afloram,
senão a pureza de coração, enquanto casta e ilibada devoção.
J.A.R. – H.C.
Manuel Bandeira
(1886-1968)
Natal
Penso em Natal. No
teu Natal. Para a bondade
A minhalma se volta.
Uma grande saudade
Cresce em todo o meu
ser magoado pela ausência.
Tudo é saudade... A
voz dos sinos... A cadência
Do rio... E esta
saudade é boa como um sonho!
E esta saudade é um
sonho... Evoco-te... Componho
O ambiente cuja luz
os teus cabelos douram.
Figuro os olhos teus,
tristes como eles foram
No momento final de
nossa despedida...
O teu busto pendeu
como um lírio sem vida,
E tu sonhas, na paz
divina do Natal...
Ó minha amiga, aceita
a carícia filial
De minhalma a teus
pés humilhada de rastos.
Seca o pranto feliz
sobre os meus olhos castos...
Ampara a minha
fronte, e que a minha ternura
Se torne insexual,
mais do que humana, – pura
Como aquela fervente
e benfazeja luz
Que Madalena viu nos
olhos de Jesus...
(Clavadel, 1913)
Em: “A Cinza das Horas” (1917)
Flerte no Jardim
(Ludwig Stutz: pintor
alemão)
Referência:
BANDEIRA, Manuel. Natal. In:
__________. Poesias. 7. ed. Rio de
Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1955. p. 73.
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