Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

Herman Melville - Camões (Antes e Depois)

Este poema em duas partes, do escritor e poeta norte-americano, foi publicado postumamente ao passamento de Melville, e se detém, primeiramente, a evocar os momentos que deram ensejo à obra mais célebre da literatura portuguesa, quando Camões esteve a serviço das armas lusitanas na Índia e em Macau, havendo sido aprisionado, pouco depois, em Goa: tudo são belas páginas que mesclam feitos heróicos a outros de lírica impecável.

A segunda parte, em forma de soneto, captura, por outro lado, a expressão de Camões enquanto heroi errante, convertido em poeta desencantado, vivendo os seus derradeiros dias, na pobreza, num hospital em Lisboa: triste fado para um vate que imortalizou o bravo espírito de aventura dos seus pares.

Um adendo: para quem deseja melhor se informar sobre a influência da obra de Camões – “Os Lusíadas”, em especial – nos trabalhos de Melville, tem-se aqui um artigo com o título “Melville e os portugueses”, de autoria da Profa. Dra. Irene Hirsch, da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP/MG): mera coincidência as obras maiores de Camões e de Melville (“Moby Dyck”) passarem-se sobre o mar? Nem tanto ao mar nem tanto à terra! (rs).

J.A.R. – H.C.

Herman Melville
(1819-1891)

Camöens (Before)
(ASCHER, 1998, p. 90)

Ever restless, restless, craving rest –
Forever must I fan this fire,
Forever in flame on flame aspire?
Yea, for the God demands thy best.
The world with endless beauty teems,
And thought evokes new worlds of dreams:
Hunt then the flying herds of themes!
And fan, yet fan thy fervid fire,
Until the crucible gold shall show
That fire can purge as well as glow.
In ordered ardor, nobly strong,
Flame to the height of epic song.

Camões (Antes)
(ASCHER, 1998, p. 91)

Devo – incansável que descansaria –
sempre atiçar meu fogo? Não tem fim
o afã que, chama em chamas, arde em mim?
Sim, porque o Deus requer tua porfia.
O mundo exibe tal beleza, enquanto
mais mundos sonha a mente: vai, portanto,
caçar mil temas no ar para o teu canto.
E atiça, atiça o fogo até que, enfim,
comprove, acrisolado, o ouro sem par,
que o fogo é luz, mas sabe depurar.
Com árduo ardor, nobre vigor, ateia,
no alto mais alto, a chama epopeia.

Luís Vaz de Camões
(1524-1580)

Camöens in the Hospital (After)
(ASCHER, 1998, p. 92)

What now avails the pageant verse,
Trophies and arms with music borne?
Base is the world; and some rehearse
How noblest meet ignoble scorn.
Vain now the ardor, vain thy fire,
Delirium mere, unsound desire:
Fate’s knife hath ripped thy chorded lyre.
Exhausted by the exacting lay,
Thou dost but fall a surer pray
To vile and guile ill understood;
While they who work them, fair in face,
Still keep their strength in prudent place,
And claim they worthier run life’s race,
Serving high God with useful good.

Camões no Hospital (Depois)
(ASCHER, 1998, p. 93)

De que vale – cortejo triunfante
de armas, troféus e música – o teu verso?
O mundo é vil; há quem, no entanto, cante
que o fado do mais nobre é sempre adverso.
Inúteis já, teu fogo e ardor contínuo
reduzem-se a delírio e desatino:
rasgou-te a lira, o gume do destino.
Exausto da exigente trova, agora
te tornas presa fácil da pletora
de enganos traiçoeiros e do engodo;
mas quem finge virtude e os trama é gente
que ainda preserva num lugar prudente,
a força e diz viver mais dignamente
servindo em tudo a Deus no melhor modo.

Referência:

ASCHER, Nelson (Tradução e Organização). Poesia alheia: 124 poemas traduzidos. Rio de Janeiro, RJ: Imago, 1998. (Coleção “Lazuli”)

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