O Nobel (1977) sevilhano apreende a vida pulsando num coração
prospectivo, efêmero pássaro de papel capaz de aquilatar o momento exato em que
a floração dos beijos se aproxima, no fluxo cíclico de nascimento, vida e
óbito.
Nesse delírio surrealista, os sonhos do poeta fluem como um rio, e as
palavras ou a própria consciência assemelham-se a juncos que brotam do sangue.
E assim a vida colhe suas verdades primordiais da própria poesia, ela mesma uma
forma de vida, retroalimentando-se...
J.A.R. – H.C.
Vicente Aleixandre
(1898-1984)
Vida
Un pajaro de papel en
el pecho
dice que el tiempo de
los besos no ha llegado;
vivir, vivir, el sol
cruje invisible,
besos o pájaros,
tarde o pronto o nunca.
Para morir basta un
ruidillo,
el de otro corazón al
callarse,
o ese regazo ajeno
que en la tierra
es un navío dorado
para los pelos rubios.
Cabeza dolorida,
sienes de oro, sol que va a ponerse;
aquí en la sombra sueño
con un río,
juncos de verde
sangre que ahora nace,
sueño apoyado en ti
calor o vida.
En: “La desctrucción o el amor” (1935)
Trigal com Segadora e Sol
(Vincent van Gogh:
pintor holandês)
Vida
Um pássaro de papel
que trago no peito
diz-me que o tempo
para beijos ainda não chegou;
viver, viver, o sol
crepita invisível,
beijos ou pássaros,
tardia ou prontamente ou nunca.
Para morrer basta um pequeno
ruído,
o ruído de um outro
coração ao calar-se,
ou esse regaço distanciado
que na terra
é um navio dourado
para os cabelos louros.
Cabeça colorida,
templos de ouro, sol que vai se pôr;
aqui na sombra sonho
com um rio,
juncos de verde
sangue que agora nasce,
sonho apoiado em ti,
calor ou vida.
Em: “A destruição ou o amor” (1935)
Referência:
ALEIXANDRE, Vicente. Vida. In:
__________. A longing for the light:
selected poems of Vicente Aleixandre. A Bilingual Edition: Spanish – English. Edited
by Lewis Hyde. 1st ed. Port Townsend, WA: Copper Canyon Press, 1985. p. 70.
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