Num estilo fluído, sem impor maiores obstáculos à leitura e à
interpretação, este soneto do reputado dicionarista alagoano permite
associações à forma de amor incondicional, profundamente humano, sem fixação
excessiva em sua componente sensual.
Um amor assim é para poucos: a arte da convivência e da tolerância com
os semelhantes está em baixa por estas paragens. A par de toda a evolução
tecnológica, o ser humano ainda não se cultivou o suficiente para tornar a vida
sobre a terra menos áspera.
J.A.R. – H.C.
Aurélio Buarque de Holanda
(1910-1989)
Amar-te
Amar-te – não por
gozo da vaidade,
Não movido de orgulho
ou de ambição,
Não à procura da
felicidade,
Não por divertimento
à solidão.
Amar-te – não por tua
mocidade
– Risos, cores e
luzes de verão –
E menos por fugir à
ociosidade,
Como exercício para o
coração.
Amar-te por amar-te:
sem agora,
Sem amanhã, sem ontem,
sem mesquinha
Esperança de amor,
sem causa ou rumo.
Trazer-te incorporada
vida fora,
Carne de minha carne,
filha minha,
Viver do fogo em que
ardo e me consumo.
Paixão Noturna
(Leonid Afremov:
pintor israelense)
Referência:
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda.
Amar-te. In: __________. Seleta em prosa
e verso. Organização e notas de Paulo Rónai. Rio de Janeiro, RJ: José
Olympio; Brasília, DF: Instituto Nacional do Livro, 1979. Nota 5, p. 189.
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