Um poema que sumaria a saga do negro brasileiro, desde a África de suas
origens até as senzalas da casa-grande. Um enredo que marca até hoje os seus
descendentes, naquilo que não contam com igualdade de oportunidades para poderem
progredir na vida.
Ou por outra: igualdade de oportunidades, sem igualdade no ponto de
partida, torna-se um discurso vazio e hipócrita. Pois o governo privatizou a
educação básica, deixando à míngua quem depende de escolas públicas do ensino
fundamental e médio – de qualidade ultrainsatisfatória –, de forma que jamais
os negros, a comporem a maioria dos pobres desta nação, chegarão em igualdade
de condições no mercado de trabalho, quer público quer privado.
Por conseguinte, procuram-se negros na direção das empresas e
empreendimentos brasileiros... São um infinitésimo percentual. Grassam eles nos
grandes espaços urbanos favelizados das maiores capitais do país, conformando a
paisagem indelével que os turistas vindos de outras paragens mais amenas são forçados a
constatar de plano!
J.A.R. – H.C.
Raul Bopp
(1898-1984)
Negro
Pesa em teu sangue a
voz de ignoradas origens.
As florestas
guardaram na sombra o segredo da tua história.
A sua primeira
inscrição em baixo-relevo
foi uma chicotada no
lombo.
Um dia
atiraram-te no bojo
de um navio negreiro.
E durante longas
noites e noites
vieste escutando o
rugido do mar
como um soluço no
porão soturno.
O mar era um irmão da
tua raça.
Uma madrugada
baixaram as velas do
convés.
Havia uma nesga de terra
e um porto.
Armazéns com
depósitos de escravos
e a queixa dos teus
irmãos amarrados em coleiras de ferro.
Principiou aí a sua
história.
O resto,
o que ficou para
trás,
o Congo, as florestas
e o mar
continuam a doer na
corda do urucungo. (*)
De: “Urucungo: poemas negros” (1932)
Capoeira
(Johann Moritz
Rugendas: pintor alemão)
Nota:
(*) Instrumento musical africano.
Referência:
BOPP, Raul. Negro. In: __________. Seleta em prosa e verso. Organização,
estudo e notas do Prof. Amariles Guimarães Hill. Rio de Janeiro, GB: Livraria
José Olympio Editora; Brasília, DF: Instituto Nacional do Livro - Ministério da
Educação e Cultura, 1975. p. 13. (Coleção “Brasil Moço”)
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