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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Kay Ryan - Um Mau Momento para o Sublime

A técnica e a ciência têm o poder de “desencantar” o mundo – diria Max Weber –, eliminar dele aquilo que nele há de mágico, ou, de outra forma, não se acomoda aos ditames da racionalidade ocidental.

Como a magia, o sublime também tem saído da ordem do dia, afirma Ryan, em detrimento de temas, por vezes, especulativos. No caso, o poeta levanta a questão se o pintor El Greco sofria de miopia – efetivamente, as análises científicas se atêm a se ele sofria de astigmatismo –, pois suas figuras tendem a ser alongadas.

Há conclusões em estudos, contudo, a afirmar que, mesmo que El Greco fosse astigmático, teria ele se adaptado às lentes, e suas figuras, quer extraídas da memória quer do dia a dia, apresentariam, de fato, proporções normais. O alongamento delas, por conseguinte, seria uma forma de expressão artística, um maneirismo deliberado, não um sintoma visual (*).

J.A.R. – H.C.

Kay Ryan
(n. 1945)

A Bad Time for the Sublime

The sublime is now
a less popular topic
than if El Greco was myopic.
Yes El Greco may very well
have been, which may very
well have made his men
so thin and his women so
distressed. If pressed,
the oculists confess that
the shape taken by the
aqueous humor makes
or breaks us, and have
devised anti-vision devices
that restore noses to their
right lengths and places.
Witness how a speckled plain
condenses to a field
or farmyard, the ecstasy
or pain of space
erased by moving the lens
back or forward.
We now discover there were
many thin kings and
many chubby martyrs,
many ordinary trees
and water always very
similar to our water.

1985

A Purificação do Templo
(El Greco: artista grego)

Um Mau Momento para o Sublime

O sublime é agora
um tema menos popular
do que se El Greco era míope.
Sim, El Greco bem pode ter sido
míope, o que explicaria
adequadamente
o fato de seus homens serem
tão magros e suas mulheres
tão aflitas. Se pressionados,
os oculistas confessariam que
a forma adotada pelo
humor aquoso nos conforma
ou nos arruína, motivo por que têm
concebido dispositivos antivisão
que restabelecem os narizes aos seus
corretos tamanho e lugar.
Testemunhariam como uma
campina mosqueada
se condensa a um campo
ou a um pátio de herdade, o êxtase
ou a dor do espaço
suprimido ao se mover a lente
para trás ou para frente.
Descobrimos agora que havia
muitos reis magros e
muitos mártires gorduchos,
muitas árvores comuns
e água sempre muito
parecida com a de nossos dias.

1985

Nota:

(*) - Vide, por exemplo, o estudo constante neste endereço.

Referência:

RYAN, Kay. A bad time for the sublime. In: Lehman, David; Brehm, John (Eds.). The Oxford book of american poetry. 9th printing. New York, NY: Oxford University Press Inc., 2006. p. 1.023.

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