Bosquet, ucraniano naturalizado francês, tergiversa sobre a
independência do poema em relação ao próprio poeta que o redigiu, eis que dotado
de vontade própria, enquanto criação concebida em primeiro plano, anteposta ao
criador, dele separado para poder se expandir à vontade.
Como apraz aos grandes poetas contemporâneos, infensos à ideia de que a
sua arte deriva de circunstancial inspiração das musas, percebe-se em Bosquet o
trabalho concentrado no uso da linguagem, para criar ou recriar um mundo que
subsiste nos (e para além dos) meandros da palavra.
J.A.R. – H.C.
Alain Bosquet
(1919-1998)
Le poète et le poème
J’ai mal à mon poème
avant ses deux naissances:
sur le papier, dans
mes poumons.
Il m’investit, ô
concurrence
comme un démon
qui ressemble à l’enfant
qu’on jette à la poubelle
dans la colère et le mépris!
Il m’arrache mes vers rebelles:
les ai-je écrits?
J’ai mal à mon poème
au cours de l’écriture
car il refuse mes
leçons.
Je suis pour lui un
peu d’ordure:
un limaçon.
Je me demande quand
je pourrai le comprendre,
son rythme devenant le mien.
Je suis sévère et parfois tendre
comme un vieux chien.
Il me traite en
félon: à quoi sert le poète
si sans lui le poème
est vrai?
Je suis la présence
indiscrète:
tirez un trait !
J’ai moins mal au
poème, une fois qu’il s’installe,
définitif, posé,
charnu,
et mon humeur se fait
égale
quand je l’ai lu.
Je l’accepte, il m’accepte: une douce harmonie
devrait, je crois, se
répéter.
Toute équivoque s’est
bannie:
sérénité!
l nous faudra ensemble
aller à la conquête
de ce vaste univers,
hardis
car le poème et le
poète
sont interdits.
(“Un jour après
la vie”, 1984)
O Escritor
(Julia Swartz:
pintora norte-americana)
O poeta e o poema
Dói meu poema em mim
nos seus dois nascimentos:
sobre o papel, dentro em meu peito.
Ele me investe, ó enfrentamento,
demônio feito
essa criança a quem
se atira fora, ao lixo,
com tanta raiva e
rejeição!
Rapta meus versos, só
capricho:
São meus ou não?
Dói meu poema em mim
no curso da escritura
pois que não quer
minha lição.
Para ele eu sou
escória pura:
lesma do chão.
Eu me pergunto quando
irei compreendê-lo,
trazendo o ritmo seu
comigo.
Tenho rigores ou
desvelo
de um cão amigo.
Trata-me qual vilão:
para que serve o poeta
se é bom sem ele o
verso e a rima?
Eu sou a presença
indiscreta:
Risque-se em cima!
Dói-me menos o poema
uma vez instalado,
definitivo, bem
nutrido,
e o meu humor fica
acalmado
ao tê-lo lido.
Aceito-o, ele me
aceita: uma doce harmonia
deverá, creio, vir à
cena.
Tudo de ambíguo se
esvazia:
Que paz serena!
Temos de juntos ir à
conquista da meta,
deste vasto universo,
ousados
pois o poema e o
poeta
estão vedados.
(“Um dia após a vida”, 1984)
Referência:
BOSQUET, Alain. Le poète et le poème / O poeta e o poema. Tradução de Mário Laranjeira. In:
LARANJEIRA, Mário (Seleção, tradução e introdução). Poetas de França hoje: 1945-1995. Edição bilíngue. Apresentação de Nelson Ascher.
São Paulo, SP: Edusp, 1996. p. 54-55.
❁
Que tradução horrivel!!
ResponderExcluirPrezada Júlia,
ResponderExcluirA crítica já está feita. Mas talvez você pudesse propor uma tradução poética à altura, encaminhando-a para melhoramentos do próprio tradutor acima. Se aceitar a sugestão, poderia encaminhá-la para o e-mail dele (mlaran@uol.com.br), que certamente a receberá de bom grado na Universidade de São Paulo (http://dlm.fflch.usp.br/node/231).
Um abraço,
João A. Rodrigues