Relembrando o feriado santo de hoje, Alphonsus de Guimaraens, um dos
grandes poetas do simbolismo brasileiro, demonstra a sua perícia na elaboração
deste soneto, diretamente associado ao ambiente em que se passa a ação: câmara
ardente, peristilo, portas de catedral, sexta-feira-santa...
A grandeza do poema se concentra exatamente nos recursos de sinestesia –
tão caros à poesia simbolista – empregados em seus versos: as vozes a cantar
junto aos violões, a visão do altar pelos crentes, o perfume que se espalha,
todo o roxo que recobre o ambiente.
Ao descrever com tanta propriedade os elementos religiosos, parece-nos
que Guimaraens manteve relação bastante próxima com as instituições católicas,
seus textos canônicos e convenções.
J.A.R. – H.C.
Alphonsus de Guimaraens
(1870-1921)
Portas de catedral em Sexta-feira Santa
Portas de catedral em
Sexta-feira Santa,
Grandes olhos
cristãos piedosamente erguidos
Para o Altar onde a
Glória imorredoura canta...
Brandos violões,
brandos violinos dos sentidos:
Campo-santo onde
flore a imarcescível planta
Do Amor que espera
sempre os beijos prometidos,
E na hora vesperal,
quando o luar se levanta,
Perfume para o olfato
e som para os ouvidos:
Torres de eremitério
onde os dobres dos sinos
Parecem prolongar um
réquiem surdo e frouxo,
Um responso de morte
acompanhado de hinos:
Grandes olhos
cristãos de olheiras de veludo,
Altares quaresmais
enfeitados de roxo,
Benditos para sempre
Onde revive tudo!
De: “Câmara Ardente” (Perystilum)
(1899)
Interior da Igreja de
Nossa Senhora do Pilar, em Ouro Preto (MG),
cidade natal do poeta
Referência:
GUIMARAENS, Alphonsus. Portas de
catedral em sexta-feira santa. In: __________. Cantos de amor, salmos de prece: poesias escolhidas. Estudo crítico
de Henriqueta Lisboa. Rio de Janeiro, RJ: Cia. José Aguilar Editora; Brasília,
DF: Instituto Nacional do Livro, 1972. p. 105 (“Biblioteca Manancial”, n. 6).
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