Com o sugestivo nome de Porlamar, um balneário de areias finas na ilha
de Margarita, na Venezuela – afinal, foi esta a única referência que encontrei
com o mesmo título –, o poeta angolano naturalizado brasileiro, Fernando
Ferreira de Loanda, descreve a busca das palavras perfeitas para os seus poemas
como se um mergulho fosse às profundezas abissais do mar.
Nota-se que esse rastreio sempre vem acompanhado de complementos adversativos,
de modo que a recolha se constitua em algo não tão simples assim, como na
alegoria da separação do joio do trigo, ou do fruto da amora de todo o
espinheiro à sua volta.
J.A.R. – H.C.
Fernando Ferreira de Loanda
(1924-2002)
Porlamar
Baixo às profundas
abissais da palavra:
colho-a como um ovo
entre as algas, como
uma pera na
geladeira,
como um peixe roubado
à voracidade de
outro,
como um pato abatido
no pântano, como
areia
fina, na barra, a
fugir
entre meus dedos.
Como-a
com uma pitada de
sal.
Se de veias,
sangro-a;
pétrea, sob o cinzel,
dirá o que direi,
nua,
gelada e engalanada,
confiante e
confidente.
Busco-a a madrugar,
mastim, de tocaia,
como se colhesse
amoras
temendo as silvas.
Arte Abstrata
(Wassily Kandinsky:
pintor russo)
Referência:
LOANDA, Fernando Ferreira de. Porlamar.
PINTO, José Nêumanne (Sel.). Os Cem
Melhores Poetas Brasileiros do Século. Ilustrações de Tide Hellmeister. 2.
ed. São Paulo, SP: Geração Editorial, 2004. p. 139-140.
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