E agora, José?! Quem não se lembra dessa máxima, que surgiu depois que o
cantor e compositor Paulo Diniz resolveu transformar em música, no início dos
anos 70, o mais do que famoso poema “José”, de Carlos
Drummond de Andrade?
E é sobre ele que a poetisa Adélia Prado, também mineira, se debruça,
para tecer o seu poema sobre o mesmo José, um homem do povo, que, por isso
mesmo, bem pode se chamar Pedro, haja vista que “Tu és pedra e sobre esta pedra”...
As associações não param por aí: Adélia menciona ainda um verso de outro
poema do mesmo Drummond – “No meio do caminho tinha uma pedra” –, além de aludir
a um excerto bíblico que muito se parece com Mateus 22, 2 – “O Reino dos céus é
semelhante a um rei que mandou realizar um banquete nupcial para seu filho”.
Adélia, por fim, incita o seu José (ou Pedro, tanto faz), a ir
diretamente para a cama, dormir com a sua mulher. Tudo muito lascivamente,
assim como em outros poemas da mesma Adélia!
J.A.R. – H.C.
Adélia Prado
(n. 1935)
Agora, ó José
É teu destino, ó
José,
a esta hora da tarde,
se encostar na
parede,
as mãos para trás.
Teu paletó abotoado
de outro frio te
guarda,
enfeita com três
botões
tua paciência dura.
A mulher que tens,
tão histérica,
tão histórica,
desanima.
Mas, ó José, o que
fazes?
Passeias no
quarteirão
o teu passeio maneiro
e olhas assim e
pensas,
o modo de olhar tão
pálido.
Por improvável não
conta
o que tu sentes, José?
O que te salva da
vida
é a vida mesma, ó
José,
e o que sobre ela
está escrito
a rogo de tua fé:
“No meio do caminho
tinha uma pedra”,
“Tu és pedra e sobre
esta pedra”,
a pedra, ó José, a
pedra.
Resiste, ó José.
Deita, José,
dorme com tua mulher,
gira a aldraba de
ferro pesadíssima.
O reino do céu é
semelhante a um homem
como você, José.
(Extraído de
“Bagagem”)
Homem Sozinho
(Vlad Trach: pintor
russo)
Referência:
PRADO, Adélia. Agora, ó José. In:
__________. Reunião de poesia: 150
poemas selecionados. Prefácio de Adilson Citelli. 3. ed. Rio de Janeiro, RJ:
BestBolso, 2014. p. 31-32.
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