O diplomata, ensaísta e poeta carioca Gonçalves de Magalhães –
considerado por muitos como o autor da obra inaugural do Romantismo no Brasil,
ou melhor, “Suspiros Poéticos e Saudades” – também cantou loas à experiência do
belo.
Somente não foi bela a polêmica que o autor travou com José de Alencar
sobre a visão que se deveria ter do indígena na literatura ou mesmo sobre o
ponto de vista social. Mas isso não vem ao caso aqui: o que importa, neste ‘locus’,
é a manifestação do que seja formoso, encantador, gracioso, magnânimo ou que
mais possamos arregimentar de sinonímias.
J.A.R. – H.C.
Gonçalves de Magalhães
(1811-1882)
A Beleza
Oh Beleza! Oh potência invencível,
Que na terra
despótica imperas;
Se vibras teus olhos
Quais duas esferas,
Quem resiste a teu
fogo terrível?
Oh Beleza! Oh celeste harmonia,
Doce aroma, que as
almas fascina;
Se exalas suave
Tua voz divina,
Tudo, tudo a teus pés
se extasia.
A velhice, do mundo
cansada,
A teu mando resiste
somente;
Porém que te importa
A voz impotente,
Que se perde, sem ser
escutada?
Diga embora que o teu
juramento
Não merece a menor
confiança;
Que a tua firmeza
Está só na mudança;
Que os teus votos são
folhas ao vento.
Tudo sei; mas se tu
te mostrares
Ante mim como um
astro radiante,
De tudo esquecido,
Nesse mesmo instante,
Farei tudo o que tu
me ordenares.
Se até hoje remisso
não arde
Em teu fogo amoroso
meu peito,
De estoica dureza
Não é isto efeito;
Teu vassalo serei
cedo ou tarde.
Infeliz tenho sido
até agora,
Que a meus olhos te
mostras severa;
Nem gozo a ventura,
Que goza uma fera;
Entretanto ninguém
mais te adora.
Eu te adoro como o
anjo celeste,
Que da vida os
tormentos acalma;
Oh vida da vida,
Oh alma desta alma,
Um teu riso sequer me
não deste!
Minha lira que triste
ressoa,
Minha lira por ti
desprezada,
Assim mesmo triste,
Assim malfadada,
Teu poder, teus
encantos pregoa.
Oh Beleza, meus dias
bafeja,
Em teu fogo minha
alma devora;
Verás de que modo
Meu peito te adora,
E que incenso
ofertar-te deseja.
Referência:
MAGALHÃES, Gonçalves de. A beleza. In: MESQUITA,
Ari de (Seleção, prefácio e notas). O Livro
de ouro da poesia universal: 30 séculos de poesia do século IX a.c. até o
século XX. Antologia. Rio de Janeiro: Tecnoprint/Ediouro, 1988. p. 387.
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