Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 29 de março de 2015

Jorge Luis Borges - Arte Poética

Borges é sempre uma referência segura, mesmo quando leva o leitor para além da realidade, contando histórias pretensamente verdadeiras (rs).

Mas se dizemos “referência segura”, aludimos à beleza e perfeição de sua prosa: um porto invulnerável ao qual recorrem aqueles sedentos de poesia. E tanto mais se o poeta se compraz em descrever sob a forma de metáforas esse fluxo ininterrupto, esse “rio interminável” que constitui o fenômeno poético. Entre a carência e a imortalidade!

J.A.R. – H.C.

Jorge Luis Borges
(1899-1986)

Arte Poética

Mirar el río hecho de tiempo y agua
y recordar que el tiempo es otro río,
saber que nos perdemos como el río
y que los rostros pasan como el agua.

Sentir que la vigilia es otro sueño
que sueña no soñar y que la muerte
que teme nuestra carne es esa muerte
de cada noche, que se llama sueño.

Ver en el día o en el año un símbolo
de los días del hombre y de sus años,
convertir el ultraje de los años
en una música, un rumor y un símbolo.

Ver en la muerte el sueño, en el ocaso
un triste oro, tal es la poesía
que es inmortal y pobre. La poesía
vuelve como la aurora y el ocaso.

A veces en las tardes una cara
nos mira desde el fondo de un espejo;
el arte debe ser como ese espejo
que nos revela nuestra propia cara.

Cuentan que Ulises, harto de prodigios,
lloró de amor al divisar su Itaca
verde y humilde. El arte es esa Itaca
de verde eternidad, no de prodigios.

También es como el río interminable
que pasa y queda y es cristal de un mismo
Heráclito inconstante, que es el mismo
y es otro, como el río interminable.

Récita do Próprio Poeta

Arte Poética

Olhar o rio feito de tempo e água
E recordar que o tempo é outro rio,
Saber que nos perdemos como o rio
E que os rostos passam como a água.

Sentir que a vigília é outro sonho
Que sonha não sonhar e que a morte
Que nossa carne teme é essa morte
De cada noite, que se chama sonho.

Ver no dia ou no ano um símbolo
Dos dias do homem e dos seus anos,
Converter o ultraje dos anos
Numa música, num rumor, num símbolo,

Ver na morte o sonho, no ocaso
Um ouro triste, tal é a poesia
Que é imortal e pobre. A poesia
Retorna como a aurora ou o ocaso.

Às vezes nas tardes uma cara
Nos olha desde o fundo de um espelho;
A arte deve ser como esse espelho
Que nos revela nossa própria cara.

Contam que Ulisses, farto de prodígios,
Chorou de amor ao divisar sua Ítaca
Verde e humilde. A arte é essa Ítaca,
De verde eternidade, não de prodígios.

Também é como o rio interminável
Que passa e fica e é o cristal de um mesmo
Heráclito inconstante, que é o mesmo
E é outro, como o rio interminável.

Referência:

BORGES, Jorge Luis. Arte poética. In: JIMENÉZ, José Olivio (Selección, prólogo y notas). Antología de la poesía hispanoamericana contemporánea: 1914-1970. 7. ed. Madrid, ES: Alianza Editorial, 1984. p. 204-205. (El Libro del Bolsillo)

2 comentários:

  1. Meu Caro amigo, como é bom descobrir e logo reconhecer um poeta de irreproduzíveis cores. Achei seu blog de uma simplicidade tão sofisticada, que foi difícil sair. Obrigado por compartilhar tanto bom gosto e vontade de viver. Um forte abraço. Maurício.

    ResponderExcluir
  2. Caro Maurício: agradeço bastante pelo elogio. Espero manter ainda por um bom tempo este bloguinho. Um grande abraço. J.A.R.

    ResponderExcluir