Num poema marcado pelo escárnio, a poetisa portuguesa Sophia de Mello
dirige-se àqueles que, arrogando-se a qualidade da sensibilidade, exploram o
suor e o sangue de terceiros para atingir os seus objetivos; não são capazes de
matar os animais, mas os comem. Ao
final, Sophia emprega uma paródia bíblica, embora invertida, para sacramentar o
aludido efeito sarcástico: “Perdoai-lhes Senhor, porque eles sabem o que fazem”.
J.A.R. – H.C.
Sophia de Mello
Breyner Andresen nasceu no Porto, em 1919, e [faleceu em Lisboa, em 2004](*).
Começou a publicar poesias em 1944, contando-se desde então abundante criação
poética. O poema desta postagem foi extraído de sua obra “Livro Sexto”, de 1962
(COSTA E SILVA; BUENO, 1999, p. 450).
Sophia de Mello
(1919-2004)
As Pessoas Sensíveis
As pessoas sensíveis
não são capazes
De matar galinhas
Porém são capazes
De comer galinhas
O dinheiro cheira a
pobre e cheira
À roupa do seu corpo
Aquela roupa
Que depois da chuva
secou sobre o corpo
Porque não tinham
outra
O dinheiro cheira a
pobre e cheira
A roupa
Que depois do suor
não foi lavada
Porque não tinham
outra
“Ganharás o pão com o
suor do teu rosto”
Assim nos foi imposto
E não:
“Com o suor dos
outros ganharás o pão”.
Ó vendilhões do templo
Ó construtores
Das grandes estátuas
balofas e pesadas
Ó cheios de devoção e
de proveito
Perdoai-lhes Senhor
Porque eles sabem o
que fazem.
Nota:
(*) Informação extraída deste endereço na
wikipédia.
Referência:
ANDRESEN, Sophia de Melo Breyner. As
pessoas sensíveis. In: COSTA E SILVA, Alberto da; BUENO, Alexei (Organização e
Introdução). Antologia da poesia
portuguesa contemporânea: um panorama. Rio de Janeiro, RJ: Lacerda, 1999.
p. 83.
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