Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 10 de dezembro de 2025

Primo Levi - Epígrafe

Nestas linhas de Levi, escritas a partir da perspectiva de Micca – um partidário ou combatente contra a opressão, provavelmente durante a 2GM –, evocam-se palavras que habitualmente são registradas em inscrições sepulcrais – daí o título “Epígrafe” para o poema –, como se fossem a dicção pungente por ele deixada a quem passe  junto à sua tumba.

 

Tendo sido morto por seus próprios companheiros, por erro ou culpa que não se especifica, embora “grave”, Micca parece aceitar seu destino sem buscar redenção, muito embora – decerto impactado pelo peso da memória – sublinhe que é necessário evitar-se a qualquer custo a repetição de tanto sofrimento e violência, de tragédias sem fim engendradas por conflitos bélicos, para que assim se mantenha incólume a divisa da paz entre os homens.

 

J.A.R. – H.C.

 

Primo Levi

(1919-1987)

 

Epigrafe

 

O tu che segni, passeggero del colle,

Uno fra i molti, questa non più solitaria neve,

Porgimi ascolto: ferma per pochi istanti il tuo corso

Qui dove m’hanno sepolto, senza lacrime, i miei compagni:

Dove, per ogni estate, di me nutrita cresce

Più folta e verde che altrove l’erba mite del campo.

Da non molti anni qui giaccio io, Micca partigiano,

Spento dai miei compagni per mia non lieve colpa,

Né molti più ne avevo quando l’ombra mi colse.

 

Passeggero, non chiedo a te né ad altri perdono,

Non preghiera né pianto, non singolare ricordo.

Solo una cosa chiedo: che questa mia pace duri,

Che perenni su me s’avvicendino il caldo ed il gelo,

Senza che nuovo sangue, filtrato attraverso le zolle,

Penetri fino a me col suo calore funesto

Destando a nuova doglia quest’ossa oramai fatte pietra.

 

6 ottobre 1952

 

Escalando montanha

(Gull G.: artista paquistanês)

 

Epígrafe

 

Ó tu que riscas, caminhante da colina,

Um dentre tantos, esta neve não mais solitária,

Dá-me ouvidos: detém por uns instantes teu curso

Aqui onde me enterraram, sem lágrimas, meus companheiros:

Onde, em cada verão, de mim nutrida cresce

Mais densa e verde que alhures a relva tenra do campo.

Há não muitos anos aqui repouso, Micca, partigiano,

Morto pelos companheiros por minha não leve culpa,

Nem muitos mais eu tinha quando me colheu a sombra.

 

Caminhante, não peço a ti nem a outros o perdão,

Nem a prece nem o pranto, nem singular lembrança.

Peço somente uma coisa: que esta minha paz dure,

Que perenes sobre mim se sucedam calor e frio,

Sem que novo sangue, filtrado pelos torrões,

Penetre até mim com seu calor funesto

Despertando nova dor nestes ossos já empedrados.

 

6 de outubro de 1952

 

Referência:

 

LEVI, Primo. Epigrafe / Epígrafe. Tradução de Maurício Santana Dias. In: __________. Mil sóis: poemas escolhidos. Seleção, tradução e apresentação de Maurício Santana Dias. 1. ed. São Paulo, SP: Todavia, 2019. Em italiano: p. 40; em português: p. 41.

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