Nestas linhas de
Levi, escritas a partir da perspectiva de Micca – um partidário ou combatente
contra a opressão, provavelmente durante a 2GM –, evocam-se palavras que
habitualmente são registradas em inscrições sepulcrais – daí o título “Epígrafe”
para o poema –, como se fossem a dicção pungente por ele deixada a quem passe junto à sua tumba.
Tendo sido morto por
seus próprios companheiros, por erro ou culpa que não se especifica, embora “grave”,
Micca parece aceitar seu destino sem buscar redenção, muito embora – decerto
impactado pelo peso da memória – sublinhe que é necessário evitar-se a qualquer
custo a repetição de tanto sofrimento e violência, de tragédias sem fim engendradas
por conflitos bélicos, para que assim se mantenha incólume a divisa da paz
entre os homens.
J.A.R. – H.C.
Primo Levi
(1919-1987)
Epigrafe
O tu che segni,
passeggero del colle,
Uno fra i molti,
questa non più solitaria neve,
Porgimi ascolto:
ferma per pochi istanti il tuo corso
Qui dove m’hanno
sepolto, senza lacrime, i miei compagni:
Dove, per ogni
estate, di me nutrita cresce
Più folta e verde che
altrove l’erba mite del campo.
Da non molti anni qui
giaccio io, Micca partigiano,
Spento dai miei
compagni per mia non lieve colpa,
Né molti più ne avevo
quando l’ombra mi colse.
Passeggero, non
chiedo a te né ad altri perdono,
Non preghiera né
pianto, non singolare ricordo.
Solo una cosa chiedo:
che questa mia pace duri,
Che perenni su me
s’avvicendino il caldo ed il gelo,
Senza che nuovo
sangue, filtrato attraverso le zolle,
Penetri fino a me col
suo calore funesto
Destando a nuova
doglia quest’ossa oramai fatte pietra.
6 ottobre 1952
Escalando montanha
(Gull G.: artista
paquistanês)
Epígrafe
Ó tu que riscas,
caminhante da colina,
Um dentre tantos,
esta neve não mais solitária,
Dá-me ouvidos: detém
por uns instantes teu curso
Aqui onde me
enterraram, sem lágrimas, meus companheiros:
Onde, em cada verão,
de mim nutrida cresce
Mais densa e verde
que alhures a relva tenra do campo.
Há não muitos anos
aqui repouso, Micca, partigiano,
Morto pelos
companheiros por minha não leve culpa,
Nem muitos mais eu
tinha quando me colheu a sombra.
Caminhante, não peço
a ti nem a outros o perdão,
Nem a prece nem o pranto,
nem singular lembrança.
Peço somente uma
coisa: que esta minha paz dure,
Que perenes sobre mim
se sucedam calor e frio,
Sem que novo sangue,
filtrado pelos torrões,
Penetre até mim com
seu calor funesto
Despertando nova dor
nestes ossos já empedrados.
6 de outubro de 1952
Referência:
LEVI, Primo. Epigrafe / Epígrafe. Tradução de Maurício Santana Dias. In: __________. Mil sóis: poemas escolhidos. Seleção, tradução e apresentação de Maurício Santana Dias. 1. ed. São Paulo, SP: Todavia, 2019. Em italiano: p. 40; em português: p. 41.
❁


Nenhum comentário:
Postar um comentário