Fazendo referência ao
dicionário de uso do espanhol, elaborado pela lexicógrafa espanhola María
Moliner (1900-1981), o falante procura analisar, a partir de suas próprias
experiências, o significado da expressão “fazer amor” ao longo de sua adolescência
e juventude, atento à mutação semântica a que estão expostas as palavras,
levando a eventuais impactos na comunicação entre os interlocutores de um determinado
idioma.
Na adolescência do sujeito
lírico, “fazer amor” significava “cortejar”, como enviar flores à namorada ou
escrever-lhe poemas, nada mais físico, o que denota certa visão inocente, ou talvez
idealista, do autor. Um pouco mais à frente, entre os 19 e os 24 anos, a expressão
assumiu um significado mais íntimo – ocupando o lugar de termos vulgares e
vocábulos técnicos –, ou mesmo impregnou-se de conotações religiosas – sugerindo
pureza, sacralidade ou pecado –, contexto indicativo de uma mudança da
inocência a uma compreensão mais madura do amor e da intimidade.
Nessa transição, interpretações
errôneas da expressão deram ensejo a decepções e perdas nos relacionamentos,
tudo porque as palavras não se circunscrevem tão apenas à definição literal que
lhes são atribuídas formalmente, senão também carregam toda uma carga emocional
e cultural que sobre elas decantam por efeito direto das interações humanas.
J.A.R. – H.C.
José Emilio Pacheco
(1939-2014)
El uso de las
palabras
Semántica: Estudio
del uso de las palabras.
María Moliner: Diccionario
de uso del español
En los feroces días
de mi adolescencia tristísima
la expresión “hacer
el amor” significaba “cortejo”.
“Te hacía el amor”
enviándote flores
o escribiendo
versitos y nada más.
En algún momento,
entre mis diecinueve
y mis veinticuatro,
“hacer el amor”
llenó el lugar que
ocupaban
obscenidades,
vocablos técnicos
o impregnados de
incienso y confesionario.
Nuestros mejores años
para “hacer el amor”
se disiparon en la
frustración,
se hundieron
lamentables
– por engaño y por
culpa de la semántica.
A harmonia do amor
(Zsolt Malasits:
artista húngaro)
O uso das palavras
Semântica: Estudo do
uso das palavras.
María Moliner: Dicionário
de uso do espanhol
Nos ferozes dias de
minha adolescência tristíssima,
a expressão “fazer
amor” significava “cortejar”.
Eu “fazia amor
contigo” enviando-te flores
ou escrevendo
pequenos versos e nada mais.
Em algum momento,
entre os meus
dezenove e vinte e quatro anos,
“fazer amor”
preencheu o lugar que
ocupavam
as obscenidades,
vocábulos técnicos
ou impregnados de
incenso e confessionário.
Nossos melhores anos
para “fazer amor”
dissiparam-se em
frustração,
afundaram-se
lamentavelmente
– por engano e por
culpa da semântica.
Referência:
PACHECO, José Emilio.
El uso de las palabras. In: __________. El silencio de la luna: poemas (1985-1993).
Edición especial. México, D.F.: Ediciones Era; Casa de Poesía Silva, 1996. p.
69.
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