Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 22 de dezembro de 2025

Carlos Drummond de Andrade - O que fizeram do Natal

Eis uma autêntica elegia pelo sagrado, cuja essência tem-se desvanecido, progressivamente, em meio ao ruído e à agitação da vida contemporânea, desconectando as festas religiosas de suas prístinas origens, fundamentos e significados espirituais, para convertê-las em oportunidades de consumo, entretenimentos e frivolidades.

 

O fenômeno da secularização e da supressão dos princípios devotos vão a par com a superficialidade com que as gerações recentes se entregam aos prazeres mais mundanos, dando ensejo a contrastes discordes ao longo desta quadra natalina – desde os seus exórdios vocacionada à renovação da esperança em um mundo melhor, ao fortalecimento da fé, em suma, à conexão com o divino.

 

J.A.R. – H.C.

 

Carlos Drummond de Andrade

(1902-1987)

 

O que fizeram do Natal

 

Natal.

O sino longe toca fino.

Não tem neves, não tem gelos.

Natal.

Já nasceu o deus menino.

As beatas foram ver,

encontraram o coitadinho

(Natal)

mais o boi mais o burrinho

e lá em cima

a estrelinha alumiando.

Natal.

 

As beatas ajoelharam

e adoraram o deus nuzinho

mas as filhas das beatas

e os namorados das filhas,

mas as filhas das beatas

foram dançar black-bottom

nos clubes sem presépio.

 

Em: “Alguma poesia” (1930)

 

Dançando o black-bottom

(Beryl Cook: pintora inglesa)

 

Referência:

 

ANDRADE, Carlos Drummond. O que fizeram do Natal. In: __________. Receita de ano-novo. Concepção e seleção de Pedro Augusto Graña Drummond. Ilustrações de Andrés Sandoval. 1. ed. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2015. p. 10. 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário