Entre a esperança e a
incerteza do futuro, a voz lírica alude a uma beldade que se entrega à tradição
de se desejar aos pares um “feliz ano novo”, capturando a essência de um
momento liminar, sustentado, em grande parte, por uma viagem sensorial e
simbólica, digo melhor, pejada por imagens surreais, como se imersa estivesse num
estado de sonho ou de transe.
Apesar dos esforços em
abraçar os potenciais caminhos de esperança e de renovação franqueados pelo ano
que se inicia, a jovem logo renuncia ao porvir, “contraindo matrimônio” com o passado,
com o já findo ano, indicativo de que as promessas, costumeiramente feitas nos
umbrais de um novo giro ao redor do sol, rapidamente se esvaem, mantidos, por
conseguinte, os mesmos padrões, hábitos e práticas que a detêm exatamente no
ponto onde se encontra.
J.A.R. – H.C.
Beatriz Alcântara
(n. 1943)
Reveillon
A noite feita de
copos
encontrou-a virgem
pura
distribuindo uvas
gritando imprudente:
– Feliz Ano Novo!
Depois desejou uma nuvem
caminhou na esteira
da lua
ouviu o canto da
pedra
bebeu o hálito do
orvalho
chorou o anil do
branco
e ao desprender-se da
janela
contraiu núpcias com
o ano que findou.
Reveillon em Paraty
(Mali Santos: pintora
carioca)
Referência:
ALCÂNTARA, Beatriz. Reveillon. In: __________. Água da pedra. São Paulo, SP: Escrituras Editora, 1997. p. 85.



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