Este poema de Ekekiel é um vívido retrato de uma metrópole em constante transformação – em específico, pelo que pude apurar, Mumbai (ou Bombaim), na Índia, o famoso centro da indústria cinematográfico daquele país –, vista através da ótica personalíssima do poeta: a “ilha”, metáfora da urbe, se apresenta como um espaço de contradições, cheio de beleza e de horror, de potenciais a explorar e de desesperança, de confinamento e de oportunidades, de solidão e de conexão, de clareza e de confusão, de alienação e de pertencimento.
Noutro plano, percebem-se
os efeitos dessa realidade sobre a mente do falante, para quem tal sítio não
configuraria um ambiente ideal para a expressão artística, tampouco para o agrado
dos sentidos – sobretudo o da visão: modernos arranha-céus se firmam na paisagem,
ao lado do dramático adensado de favelas.
Entre o tradicional e
as novas perspectivas trazidas pelas transformações sociais e culturais
contemporâneas, o poeta não se dispõe a abandonar a “ilha” onde nasceu e à qual
pertence: como um “bom nativo”, segue a trilhar o seu caminho, procurando
enfrentar com calma as turbulências do quotidiano, em cuja voragem, amiúde,
logra reconhecer a extraordinária presença de “milagres”.
J.A.R. – H.C.
Nissim Ezekiel
(1924-2004)
Island
Unsuitable for song
as well as sense
the island flowers
into slums
and skyscrapers
reflecting
precisely the growth
of my mind
I am here to find my
way in it
Sometimes I cry for
help
but mostly keep my
own counsel
I hear distorted
echoes
of my own ambigious
voice
and of dragons
claiming to be human
Bright and tempting
breezes
flow across the
island
separating past from
the future
then the air is still
again
as I sleep the
fragrance of ignorance
How delight the soul
with absolute
sense of salvation
how
hold to a single
willed direction?
I cannot leave the
island
I was born here and
belong
Even now a host of
miracles
hurries me a daily
business
minding the ways of
the island
as a good native
should
taking calm and
clamour in my stride
Velho cansado
(Morteza Katouzian:
artista iraniano)
Ilha
Inadequada tanto para
a canção como para os sentidos,
a ilha floresce em
favelas
e arranha-céus que
refletem
precisamente a
expansão de minha mente.
Nela me encontro à
procura do meu caminho.
Às vezes, clamo por
ajuda.
Mas, na maioria das
vezes, mantenho meu próprio parecer.
Ouço ecos distorcidos
da minha própria e
ambígua voz
e de dragões que se dizem
humanos.
Vívidas e tentadoras
brisas
fluem pela ilha,
separando o passado
do futuro.
Então o ar se acalma
novamente,
enquanto adormeço a
fragrância da ignorância.
Como deleitar a alma
com um sentido
absoluto de salvação;
como se apegar
a uma única e
voluntária direção?
Não posso abandonar a
ilha:
aqui nasci e a ela
pertenço.
Mesmo agora, uma
série de milagres
precipita-me em uma
ocupação diária,
cuidando dos costumes
da ilha
como um bom nativo
deveria fazê-lo,
mantendo a calma e o
clamor em meus passos.
Referência:
EZEKIEL, Nissim.
Island. In: DESHPANDE, Gauri (Ed.). An anthology of indo-english poetry.
Delhi, IN: Hind Pocket Books, 1974. p. 16-17. (‘An Orient Paperback’)
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