Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 4 de agosto de 2025

Nissim Ezekiel - Ilha

Este poema de Ekekiel é um vívido retrato de uma metrópole em constante transformação – em específico, pelo que pude apurar, Mumbai (ou Bombaim), na Índia, o famoso centro da indústria cinematográfico daquele país –, vista através da ótica personalíssima do poeta: a “ilha”, metáfora da urbe, se apresenta como um espaço de contradições, cheio de beleza e de horror, de potenciais a explorar e de desesperança, de confinamento e de oportunidades, de solidão e de conexão, de clareza e de confusão, de alienação e de pertencimento.

 

Noutro plano, percebem-se os efeitos dessa realidade sobre a mente do falante, para quem tal sítio não configuraria um ambiente ideal para a expressão artística, tampouco para o agrado dos sentidos – sobretudo o da visão: modernos arranha-céus se firmam na paisagem, ao lado do dramático adensado de favelas.

 

Entre o tradicional e as novas perspectivas trazidas pelas transformações sociais e culturais contemporâneas, o poeta não se dispõe a abandonar a “ilha” onde nasceu e à qual pertence: como um “bom nativo”, segue a trilhar o seu caminho, procurando enfrentar com calma as turbulências do quotidiano, em cuja voragem, amiúde, logra reconhecer a extraordinária presença de “milagres”.

 

J.A.R. – H.C.

 

Nissim Ezekiel

(1924-2004)

 

Island

 

Unsuitable for song as well as sense

the island flowers into slums

and skyscrapers reflecting

precisely the growth of my mind

I am here to find my way in it

 

Sometimes I cry for help

but mostly keep my own counsel

I hear distorted echoes

of my own ambigious voice

and of dragons claiming to be human

 

Bright and tempting breezes

flow across the island

separating past from the future

then the air is still again

as I sleep the fragrance of ignorance

 

How delight the soul with absolute

sense of salvation how

hold to a single willed direction?

I cannot leave the island

I was born here and belong

 

Even now a host of miracles

hurries me a daily business

minding the ways of the island

as a good native should

taking calm and clamour in my stride

 

Velho cansado

(Morteza Katouzian: artista iraniano)

 

Ilha

 

Inadequada tanto para a canção como para os sentidos,

a ilha floresce em favelas

e arranha-céus que refletem

precisamente a expansão de minha mente.

Nela me encontro à procura do meu caminho.

 

Às vezes, clamo por ajuda.

Mas, na maioria das vezes, mantenho meu próprio parecer.

Ouço ecos distorcidos

da minha própria e ambígua voz

e de dragões que se dizem humanos.

 

Vívidas e tentadoras brisas

fluem pela ilha,

separando o passado do futuro.

Então o ar se acalma novamente,

enquanto adormeço a fragrância da ignorância.

 

Como deleitar a alma com um sentido

absoluto de salvação; como se apegar

a uma única e voluntária direção?

Não posso abandonar a ilha:

aqui nasci e a ela pertenço.

 

Mesmo agora, uma série de milagres

precipita-me em uma ocupação diária,

cuidando dos costumes da ilha

como um bom nativo deveria fazê-lo,

mantendo a calma e o clamor em meus passos.

 

Referência:

 

EZEKIEL, Nissim. Island. In: DESHPANDE, Gauri (Ed.). An anthology of indo-english poetry. Delhi, IN: Hind Pocket Books, 1974. p. 16-17. (‘An Orient Paperback’)

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