Um menino, a observar
pela janela, entristece-se ao ver o solitário boneco de neve enfrentando o frio
crepúsculo: seu espírito ainda inocente o leva a projetar emoções humanas na
figura, suscitando a percepção no falante de que, porventura, o tenha como um
ser “desterrado” e abandonado por Deus, tal como Adão quando expulso do paraíso
edênico.
De fato, o poema
retrata, com boa dose de sensibilidade, o contraste entre o calor emocional da
criança, rodeada de “luz, amor e medo”, e a fria indiferença do boneco, alheio
a tais sentimentos: de um lado, a capacidade de empatia humana, pródiga em
projetar vida e emoções inclusive nos objetos mais inertes, e do outro, a aptidão
com que estes podem refletir, quais espelhos invernais, nossos próprios temores
e vulnerabilidades.
J.A.R. – H.C.
Richard Wilbur
(1921-2017)
Boy at the Window
Seeing the snowman
standing all alone
In dusk and cold is
more than he can bear.
The small boy weeps
to hear the wind prepare
A night of gnashings
and enormous moan.
His tearful sight can
hardly reach to where
The pale-faced figure
with bitumen eyes
Returns him such a
god-forsaken stare
As outcast Adam gave
to Paradise.
The man of snow is,
nonetheless, content,
Having no wish to go
inside and die.
Still, he is moved to
see the youngster cry.
Though frozen water
is his element,
He melts enough to
drop from one soft eye
A trickle of the
purest rain, a tear
For the child at the
bright pane surrounded by
Such warmth, such
light, such love, and so much fear.
Menino olhando pela
janela
(Samuel D. van
Hoogstraeten: pintor holandês)
Menino à Janela
Ver o boneco de neve inerte
e tão sozinho
sob o crepúsculo e o
frio é mais do que ele pode suportar.
O menino chora ao
ouvir o vento preparar
uma noite de rilhados
e de enormes gemidos.
Sua vista lacrimejante
mal consegue chegar até onde
a figura de rosto
pálido, com olhos de betume,
devolve-lhe um olhar
tão desertado por Deus
quanto o que o
proscrito Adão dirigira ao Paraíso.
O homem da neve está,
no entanto, contente,
sem ter qualquer
desejo de ir para dentro e morrer.
Ainda assim,
comove-se ao ver o garoto chorar.
Embora a água congelada
seja o seu elemento,
derrete-se o
suficiente para deixar cair de um olho terno
uma gota da mais pura
chuva, uma lágrima
para uma criança
diante da vidraça reluzente, rodeada
por tanto calor,
tanta luz, tanto amor e tanta aflição.
Referência:
WILBUR, Richard. Boy
at the window. In: KEILLOR, Garrison (Selection and Introduction). Good
poems. New York, NY: Penguin Books, 2003. p. 319.
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