Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 4 de julho de 2025

Richard Wilbur - Menino à Janela

Um menino, a observar pela janela, entristece-se ao ver o solitário boneco de neve enfrentando o frio crepúsculo: seu espírito ainda inocente o leva a projetar emoções humanas na figura, suscitando a percepção no falante de que, porventura, o tenha como um ser “desterrado” e abandonado por Deus, tal como Adão quando expulso do paraíso edênico.

 

De fato, o poema retrata, com boa dose de sensibilidade, o contraste entre o calor emocional da criança, rodeada de “luz, amor e medo”, e a fria indiferença do boneco, alheio a tais sentimentos: de um lado, a capacidade de empatia humana, pródiga em projetar vida e emoções inclusive nos objetos mais inertes, e do outro, a aptidão com que estes podem refletir, quais espelhos invernais, nossos próprios temores e vulnerabilidades.

 

J.A.R. – H.C.

 

Richard Wilbur

(1921-2017)

 

Boy at the Window

 

Seeing the snowman standing all alone

In dusk and cold is more than he can bear.

The small boy weeps to hear the wind prepare

A night of gnashings and enormous moan.

His tearful sight can hardly reach to where

The pale-faced figure with bitumen eyes

Returns him such a god-forsaken stare

As outcast Adam gave to Paradise.

 

The man of snow is, nonetheless, content,

Having no wish to go inside and die.

Still, he is moved to see the youngster cry.

Though frozen water is his element,

He melts enough to drop from one soft eye

A trickle of the purest rain, a tear

For the child at the bright pane surrounded by

Such warmth, such light, such love, and so much fear.

 

Menino olhando pela janela

(Samuel D. van Hoogstraeten: pintor holandês)

 

Menino à Janela


Ver o boneco de neve inerte e tão sozinho

sob o crepúsculo e o frio é mais do que ele pode suportar.

O menino chora ao ouvir o vento preparar

uma noite de rilhados e de enormes gemidos.

Sua vista lacrimejante mal consegue chegar até onde

a figura de rosto pálido, com olhos de betume,

devolve-lhe um olhar tão desertado por Deus

quanto o que o proscrito Adão dirigira ao Paraíso.

 

O homem da neve está, no entanto, contente,

sem ter qualquer desejo de ir para dentro e morrer.

Ainda assim, comove-se ao ver o garoto chorar.

Embora a água congelada seja o seu elemento,

derrete-se o suficiente para deixar cair de um olho terno

uma gota da mais pura chuva, uma lágrima

para uma criança diante da vidraça reluzente, rodeada

por tanto calor, tanta luz, tanto amor e tanta aflição.

 

Referência:

 

WILBUR, Richard. Boy at the window. In: KEILLOR, Garrison (Selection and Introduction). Good poems. New York, NY: Penguin Books, 2003. p. 319.

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