O “rio e o mar se
completam”, diz o poeta, levando-nos a contemplar a existência humana sob a metáfora
de algo que representa o misterioso e o efêmero, a plasmar o quinhão de nosso
ser que sempre paira no vazio, com interrogantes jamais totalmente elucidadas: somos
o rio e sua fonte – que em vão buscamos compreender, para darmos conta de nosso
passado, de nossas raízes –, e, ao mesmo tempo, o mar – saída para a qual
vogamos, rumo a um futuro incerto, envolto em mistério indecifrável.
A vida, sob tal
perspectiva, torna-se travessia por uma “terceira margem”, um espaço liminar
onde o ser humano se vê desnorteado pela ambiguidade de sua própria identidade,
confinado à corrente contingente do tempo, enquanto transmigra inexoravelmente
do rio ao mar, ou como se queira, do nascimento à morte.
J.A.R. – H.C.
Per Johns
(1933-2017)
Terceira margem
a Maria Helena Varela
in memoriam
Rio e mar se
completam
e nos deixam vazios.
Um é entrada
a montante e aquém
de quem fomos um dia
Sem saber que o
fomos.
O outro é saída
Para longe e além
de onde sempre
estamos,
de onde nunca saímos.
Entre uma nascente
que em vão procuramos
e um litoral
bruxuleante
que nos chama em vão,
mal sabemos quem
somos.
O rio conhece o mar
(Anita Powell: artista
australiana)
Referência:
JOHNS, Per. Terceira
margem. Poesia sempre: revista semestral de poesia. Fundação Biblioteca
Nacional, Rio de janeiro (RJ), ano 14, n. 26, p. 183, 2007.
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