O poeta nos exorta a percebermos
a casa – esse espaço de aconchego e de acolhimento – não somente como uma
estrutura física, mas também como um ente vivo, uma criatura capaz de respirar e
de pulsar em ritmo próprio, ostentando, sob tal perspectiva, facetas ao mesmo
tempo mundanas e etéreas, concretas e oníricas – à maneira de um latejante
microcosmos onde habita a essência mesma da vida.
As imagens e metáforas
empregadas por Emil sublinham a íntima relação entre uma casa e seus
residentes, denotando, de algum modo, o conceito apreendido pelo que costumamos
designar por “lar”: dentro dela é que correm os rios dos sonhos, das emoções,
das lembranças, dos sentimentos e dos pensamentos humanos. Para mais: um lugar
onde se vivenciam sofrimentos ou intensas paixões; um recinto dual a comportar
tanto a presunção de estabilidade quanto o ideal de renovação.
J.A.R. – H.C.
Emil de Castro
(n. 1941)
A Casa
Existir de barro a
casa
e seus cômodos
de gente e coisas.
Sentir sua intimidade
nas rugas do emboço
tecido nas entranhas
de portas e janelas.
Constrecer os cantos
entre o céu e o solo
o sol de pino
aceso sobre a pedra.
A casa vista de fora
com sua existência
viva
movimentada nos seus
túneis
subterrâneos
flor detida no caule
florida no íntimo
do chão
florânea.
A casa projetada de
dentro
injetada na
transfusão
de arrastar de
cadeiras
desfeita em vento
aérea e volátil
no contorno de
sombras
solombra.
Existir de casa
suspensa no
território
onírico
pingando sangue.
Em: “Estação de partida”
(2002)
A casa do artista
(Pierre-Auguste Renoir:
pintor francês)
Referência:
CASTRO, Emil. A casa.
In: __________. 50 poemas escolhidos pelo autor: Emil de Castro. Rio de
Janeiro, RJ: Edições Galo Branco, 2003. p. 33-34. (Coleção ’50 poemas
escolhidos pelo autor’; v. 6)
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