Alpes Literários

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Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 4 de junho de 2025

Wang Wei - No Mosteiro da Porta de Pedra

O poeta chinês nos apresenta esta bela reflexão do falante, o qual, em sua sabedoria e paz de espírito, empreende uma serena travessia pelas paisagens montanhosas de Lantian, dedicando-se à meditação e à conexão com a natureza, onde encontra escape ao bulício do mundo exterior e uma zona de equilíbrio num modo de vida simples e contemplativo.

 

O fluxo dos versos amolda-se à sensação de remanso que o poeta tenciona transmitir ao leitor: primeiramente, o falante aparece navegando num bote por um rio tranquilo, numa tarde ensolarada entre montanhas cobertas de neve, árvores frondosas e o som da correnteza das águas; pouco depois, já em terra, ingressa no refúgio de um monastério, onde eremitas anciãos, em seu quotidiano monástico, partilham o amplo cenário com alguns pastores e lenhadores.

 

Guardadas as devidas distinções e proporções – afinal, a escrita de Wei muito evoca as célebres moções do zen-budismo –, permita-me aqui o internauta uma breve digressão: o poema nos faz lembrar, de algum modo, o padrão almejado de vida por parte dos nossos poetas arcádicos – com aquela idealização da natureza, da vida pastoril, bucólica e contemplativa experimentada nos sítios rurais –, por meio do qual aspiravam a alcançar, distanciados do burburinho urbano, uma felicidade simples e imediata.

 

J.A.R. – H.C.

 

Wang Wei

(701 d.C.-761 d.C.)

 

蓝田山石门精舍

 

落日山水好,漾舟信归风

玩奇不觉远,因以缘源穷

爱云木秀,初疑路不同。

安知清流偶与前山通

舍舟理轻策,果然惬所适

老僧四五人,逍遥荫松柏

朝梵林未曙,夜禅山更寂。

道心及牧童,世事问樵客

暝宿长林下,焚香卧瑶席。

涧芳袭人衣,山月映石壁。

寻畏迷误,明发更登历

谢桃源人,花红复来觌

 

Portão de Pedra

(Petar Sibenik: artista croata)

 

No Mosteiro da Porta de Pedra

 

O sol desce no céu, bonitos montes e água,

minha barca de regresso a casa, ao sabor da brisa.

Despreocupado, feliz, deixo-me conduzir para longe

algures um recanto na nascente do rio.

À minha volta, nuvens brancas, árvores, frescura,

eu meto perdido, enlevado, surpreso.

De súbito, as águas entrando pela montanha,

eu, na margem, apoiado no bastão, caminhando.

No mosteiro, entre carvalhos e pinheiros,

alguns velhos monges, meditando,

pela manhã- antes do clarear da floresta,

ao entardecer, antes do silenciar da montanha.

Os pastores, lá longe, ouvindo o cântico dos monges,

os lenhadores, aqui, trazendo as novidades do mundo.

Sob a copa das árvores, na escuridão,

os monges queimam incenso, dormem em esteiras sagradas,

a fragrância do vale perfumando-lhes as roupas,

o luar da montanha iluminando os penhascos.

Não me vou perder quando um dia aqui voltar,

acordarei ao nascer da amora, subirei a montanha.

Adeus, amigos da Nascente das Flores de Pessegueiro (*),

estarei de regresso, ao avermelharem as pétalas.

 

Nota do Tradutor

 

(*). Sob roupagem levemente diferente, Wang Wei utiliza também a história da Nascente das Flores de Pessegueiro, de Tao Yuanming (365 d.C.-427 d.C.).

 

Referências:

 

Em Chinês Simplificado

 

魏, 王. 田山石精舍. Disponível Disponível neste endereço. Acesso em: 2 jun. 2025.

 

Em Português:

 

WEI, Wang. No Mosteiro da Porta de Pedra. Tradução de António Graça de Abreu. In: __________. Poemas de Wang Wei. Tradução, prefácio e notas de António Graça de Abreu. Macau, MO: Instituto Cultural de Macau, 1993. p. 53. (Coleção ‘Clássicos Chineses’)

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