O falante intui que o
homem nu e estranho que aparece ao portão de sua morada aparenta ter natureza
divina, logo confirmada por ele mesmo, ao se apresentar como Hermes, deus
mitológico grego, conhecido por ser o mensageiro dos deuses e um mediador entre
o divino e o humano.
Uma vez convidado a
entrar, logo a potestade acomodou-se à lareira, imprimindo ao encontro um matiz
tangível e reservado, o que nos transmite a ideia de que o poeta busca enfatizar
a necessidade que temos de nos conectar com o sagrado e com ele entrar em íntimo
convívio, ainda que, amiúde, algo nessa relação se mantenha além de nossa compreensão
imediata.
Desse modo, jogando entre
o inefável, de um lado, e o ostensivo de uma presença real, de outro, Lawrence,
em última instância, empenha-se em conciliar, numa experiência quase mística, o princípio transcendente do divino com o seu elemento imanente.
Comentário de Czesław Miłosz ao poema
(Miłosz, 1998, p. 5)
D. H. Lawrence, nos versos de “Maximus”, regressa ao mundo politeísta, e o poema é tão eficaz que sentimos um choque de reconhecimento, como se nós mesmos fôssemos visitados pelo deus Hermes. Maximus é o nome de um filósofo que foi mestre do imperador Juliano, chamado o Apóstata, por haver tentado restaurar o paganismo.
A Epifania pode
significar um momento privilegiado da nossa vida entre as coisas deste mundo,
em que elas revelam subitamente algo de que não nos apercebemos até então; e
esse algo é como uma insinuação do seu lado misterioso e oculto. De certa
forma, a poesia é uma tentativa de romper a densidade da realidade para se imergir
numa zona onde as coisas mais simples voltam a ser tão frescas, como se
estivessem a ser vistas por uma criança.
Esta antologia [v.
referência] está cheia de epifanias. Decidi colocar algumas delas separadas
num primeiro capítulo, para realçar esse aspecto da poesia. Os poemas que lhes
correspondem, em particular, são uma destilação do meu tema principal.
J.A.R. – H.C.
D. H. Lawrence
(1885-1930)
Maximus (*)
God is older than the
sun and moon
and the eye cannot
behold him
nor the voice
describe him.
But a naked man, a
stranger, leaned on the gate
with his cloak over
his arm, waiting to be asked in.
So I called him: Come
in, if you will!–
He came in slowly,
and sat down by the hearth.
I said to him: And
what is your name?–
He looked at me
without answer, but such a loveliness
entered me, I smiled
to myself, saying: He is God!
So he said: Hermes!
God is older than the
sun and moon
and the eye cannot
behold him
nor the voice
describe him:
and still, this is
the God Hermes, sitting by my hearth.
In: “Last Poems”
(1932)
Mercúrio e Argos
(Diego Velázquez:
pintor espanhol)
Máximo
Deus é mais velho que
o sol e a lua
e os olhos não o
podem contemplar
nem a voz o descrever.
Mas um homem nu, um estranho,
encostou-se ao portão
com a capa sobre o braço,
à espera de que
o convidassem a
entrar.
Então o chamei:
Entra, se o quiseres!–
Ele entrou lentamente
e sentou-se junto à lareira.
Perguntei-lhe: E como
te chamas?
Ele me olhou sem
responder, mas um tal encanto
me envolveu que sorri
para mim mesmo,
afirmando: És um
Deus!
Então ele mo
confirmou: Hermes!
Deus é mais velho que
o sol e a lua
e os olhos não o
podem contemplar
nem a voz o
descrever:
e ainda assim, este é
o Deus Hermes, sentado junto
à minha lareira.
Em: “Últimos Poemas” (1932)
Nota dos Editores:
(*). Lawrence
provavelmente estava pensando em Máximo de Esmirna (o “Místico”), tutor do
imperador Juliano, um defensor do paganismo grego no século IV d.C., sobre quem
o autor teria lido em “O Imperador e Galileu”, de Ibsen. (LAWRENCE, 1988, p.
1018)
Referências:
Em Inglês
LAWRENCE, D. H. Maximus. In: __________. The complete poems of D. H. Lawrence.
Collected and edited with an introduction and notes by Vivian de Sola Pinto and
F. Warren Roberts. 1st ed., 6th repr. New York, NY: Penguin Books, 1988. p.
692.
Em Português
MIŁOSZ, Czesław
(Edition and Introduction). A book of luminous things: an international
anthology of poetry. 1st. ed. New York, NY: Houghton Mifflin Harcourt, 1998. p. 5.
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