Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 13 de junho de 2025

W. H. Auden - O Compositor

Auden tece um elogio ao poder único da música enquanto “dádiva absoluta” e pura forma de arte, contrastando o ofício do compositor ao de outras artes, como a pintura e a poesia, as quais, transmitindo do mesmo modo beleza aos sentidos, requerem, nada obstante, certa “tradução” ou representação da realidade externa, através do recurso a adaptações ou homologias de elementos do tecido da vida.

 

A música é, de fato, uma arte elevada capaz de curar a alma humana, permitindo-nos transcender as limitações terrenais e existenciais. Afinal, como exprime o poeta no derradeiro terceto, distintamente das outras formas de arte, ela não se presta a apontar os erros em nossas existências, antes, nos brinda com consolo e aceitação, ao nos indultar como se um vinho fosse.

 

J.A.R. – H.C.

 

W. H. Auden

(1907-1973)

 

The Composer

 

All the others translate: the painter sketches

A visible world to love or reject;

Rummaging into his living, the poet fetches

The images out that hurt and connect.

 

From Life to Art by painstaking adaption,

Relying on us to cover the rift;

Only your notes are pure contraption,

Only your song is an absolute gift.

 

Pour out your presence, O delight, cascading

The falls of the knee and the weirs of the spine,

Our climate of silence and doubt invading;

 

You alone, alone, O imaginary song,

Are unable to say an existence is wrong,

And pour out your forgiveness like a wine.

 

In: “Poems” (1930)

 

Johann Christian Bach

(Thomas Gainsborough: pintor inglês)

 

O Compositor

 

Todos os outros traduzem: o pintor esboça

Um mundo visível para se apreciar ou rejeitar;

Remexendo em sua vida, o poeta traz à luz

Imagens lancinantes e aglutinadoras

 

Da Vida à Arte mediante esmerada adaptação,

Contando conosco para colimar as lacunas;

Mas as tuas notas, tão apenas, são puro engenho;

Basta a tua canção como dádiva absoluta.

 

Verte a tua presença, ó deleite, cascateando

Pelos saltos dos joelhos e os diques da coluna,

Invadindo o nosso clima de dúvida e de silêncio;

 

Somente tu, tu apenas, ó canção imaginária,

Mesmo incapaz de expores os erros de uma existência,

Dispõe-te a derramar, como um vinho, o teu perdão.

 

Em: “Poemas” (1930)

 

Referência:

 

AUDEN, W. H. The composer. In: __________. The collected poetry of W. H. Auden. 6th print. New York, NY: Random House, 1945. p. 5-6.

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