Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 22 de abril de 2025

Carlos Mastronardi - Os Reis Esquecidos

Nestes versos, o poeta argentino emprega uma linguagem críptica, com imagens algo surrealistas, para transmitir a ideia de que existe um mundo de sombras, dominado por reinos ocultos que urdem uma rede de influência sobre nossas vidas, dirigindo nossos passos e quereres, sem que nos demos conta.

 

Há elementos no poema que suportam tanto uma interpretação que se oriente a levar em conta as influências externas às pessoas – a exemplo das pressões que nos impõe a sociedade sobre papéis e expectativas que, em última instância, podem nos distanciar de nossas verdadeiras identidades –, quanto internas – o mundo secreto do inconsciente, governado por forças psíquicas que condicionam nossos destinos, capazes de erigir um “cárcere” de limitações e de padrões autodestrutivos.

 

Seja como for, aos olhos do falante, seríamos como que “criaturas desertas”, à mercê de forças oprimentes, naquilo que entregues, fatal e resignadamente, ao transcurso do tempo, entre passados sepulcrais – afinal, somos também, em grande medida, os nossos mortos e ausentes! – e sonhos não realizados.

 

J.A.R. – H.C.

 

Carlos Mastronardi

(1901-1976)

 

Los Reyes Olvidados

 

A Miguel Angel Fernández

 

Las personas del sueño te persiguen y asedian

mientras juegas con seres concretos bajo el día,

y oscuras poblaciones desde los hondos años

trabajan escondidas para erigir tu cárcel.

Tejen tu viva trama muchos reyes secretos,

y en la tierra más tuya, silenciosos, se afanan

los tiranos sutiles que te dictan entero

mientras tus ojos se abren al mundo que conoces.

Suaves monstruos te llevan a un mentido futuro

que pronto será sombra tenaz de lo disuelto.

Te vulneran y vencen las flores que han ardido

en la centella larga de la edad que te inunda.

El ayer vengativo siempre aviva tu anhelo

con la rosa esperada, pero en ti ya marchita.

Los olvidados seres que a la sombra cediste,

en harapos regresan y al porvenir te arrojan.

Te excavan y te ahondan lentísimos ausentes,

oh tumba de los otros, alma vuelta al mañana,

sumisa a unos fantasmas que te sitian y roban

para entregar al tiempo la criatura desierta.

 

En: “Siete poemas” (1963)

 

Uma Lágrima

(Marcel Caram: artista mineiro)

 

Os Reis Esquecidos

 

A Miguel Angel Fernández

 

As pessoas do sonho te perseguem e te assediam,

enquanto brincas com seres concretos sob o dia,

e populações furtivas, desde incomensuráveis anos,

trabalham escondidas para erigir teu cárcere.

Muitos reis secretos tecem a tua vívida trama,

e na terra que é mais tua, silenciosos, locupletam-se

tiranos sutis que te sentenciam por inteiro,

enquanto teus olhos se abrem ao mundo que conheces.

Monstros gentis te conduzem a um futuro falacioso,

que em breve será uma sombra tenaz do dissolvido.

Vulneram-te e dominam-te as flores que têm ardido

sob a longa centelha da idade que te inunda.

O ontem vingativo sempre alimenta o teu desejo

pela esperada rosa, mas em ti já emurchecida.

Os seres esquecidos que à sombra cedeste,

em farrapos regressam e ao porvir te impelem.

Escavam-te a afundam-te lentíssimos ausentes,

ó túmulo dos outros, alma orientada ao amanhã,

submissa a alguns fantasmas que te cercam e te roubam,

para entregar ao tempo a criatura deserta.

 

Em: “Sete poemas” (1963)

 

Referência:

 

MASTRONARDI, Carlos. Los reyes olvidados. In: __________. Poesías completas. Prólogo de Juan Carlos Ghiano. Buenos Aires, AR: Academia Argentina de Letras, 1982. p. 121-122.

Nenhum comentário:

Postar um comentário