Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 11 de abril de 2025

Sharon Olds - O Menino Desaparecido

A partir dos olhos de um menino que vê, no ônibus em que se desloca, a foto de um menor desaparecido, a poetisa nos sensibiliza para as questões da vulnerabilidade da infância, da importância de empatia e de solidariedade para com os mais suscetíveis aos perigos desta vida, além, obviamente, do ingênito zelo por segurança e bem-estar que nos afeta a todos.

 

Ante a aparente dificuldade em se achar a criança desaparecida – afinal, o adesivo soltando-se sobre a foto sugere ali encontrar-se já há algum tempo –, o filho da falante preocupa-se com algo tão quotidiano quanto a alimentação do menor que se extraviou, esperando que esteja bem, a nutrir-se com a comida que mais aprecia ou a que está mais acostumado.

 

Latentes por trás da mensagem imediata dos versos, talvez algumas ideias subliminares: (i) um certo desassossego da mãe do garoto em relação a um hipotético desaparecimento de seu próprio filho – incrustado nos versos em que compara a estrutura física deste com a do menino desaparecido, como que tentando se assegurar da maior maturidade de seu rebento, capaz de livrá-lo de evasões que tais; e (ii) o conjectural recado, do garoto maior à sua genitora, de que, porventura, vem sendo alimentado por comidas não exatamente de seu agrado ou a que já está completamente familiarizado.

 

J.A.R. – H.C.

 

Sharon Olds

(n. 1942)

 

The Missing Boy

 

for Etan Patz

 

Every time we take the bus

my son sees the picture of the missing boy.

He looks at it like a mirror – the dark

blond hair, the pale skin,

the blue eyes, the electric-blue sneakers with

slashes of jagged gold. But of course that

kid is little, only six and a half,

an age when things can happen to you,

when you’re not really safe, and our son is seven,

practically fully grown – why he, would

tower over that kid if they could

find him and bring him right here on this bus and

stand them together. He sways in the silence

wishing for that, the tape on the picture

gleaming over his head, beginning to

melt at the center and curl at the edges as it

ages. At night, when I put him to bed,

my sons holds my hand tight

and says he’s sure that kid’s all right,

nothing to worry about, he just

hopes he’s getting the food he likes,

not just any old food, but the food

he likes the most, the food he is used to.

 

Perdido

(Frederick McCubbin: pintor australiano)

 

O Menino Desaparecido

 

para Etan Patz

 

Toda vez que tomamos o ônibus

meu filho vê a foto do menino desaparecido.

Olha para ela como um espelho – o cabelo

Iouro escuro, a pele clara,

os olhos azuis, o tênis azul-metálico com

listras em ouro recortado. Mas, é claro, aquele

menino é pequeno, apenas seis anos e meio,

idade em que coisas podem acontecer,

quando não se está realmente seguro, e Gabriel tem sete,

praticamente já de todo crescido – ora, ele seria

um gigante, comparado àquele menino, se pudessem

encontrá-lo e trazê-lo aqui neste ônibus e

colocá-los lado a lado. Seu corpo balança em silêncio,

desejando que isso acontecesse, o adesivo na foto

brilhando acima de sua cabeça, começando a

despregar no centro e curvar nas pontas, à medida em que

o tempo passa. À noite, quando o levo para a cama,

meu filho aperta minha mão

e diz que tem certeza de que aquele menino está bem,

não há porque se preocupar, apenas

espera que ele esteja comendo a comida de que gosta,

e não qualquer comida, mas a comida

de que mais gosta, a comida a que está acostumado.

 

Referência:

 

OLDS, Sharon. The missing boy / O menino desaparecido. Tradução de Maria Lúcia Milléo Martins. In: O’SHEA, José Roberto (Org.). Antologia de poesia norte-americana contemporânea. Edição bilíngue: inglês x português. Tradução de Maria Lúcia Milléo Martins. Florianópolis, SC: Ed. da UFSC, 1997. Em inglês: p. 154; em português: p. 155.

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