A partir dos olhos de
um menino que vê, no ônibus em que se desloca, a foto de um menor desaparecido,
a poetisa nos sensibiliza para as questões da vulnerabilidade da infância, da importância
de empatia e de solidariedade para com os mais suscetíveis aos perigos desta
vida, além, obviamente, do ingênito zelo por segurança e bem-estar que nos afeta
a todos.
Ante a aparente
dificuldade em se achar a criança desaparecida – afinal, o adesivo soltando-se sobre
a foto sugere ali encontrar-se já há algum tempo –, o filho da falante
preocupa-se com algo tão quotidiano quanto a alimentação do menor que se
extraviou, esperando que esteja bem, a nutrir-se com a comida que mais aprecia ou
a que está mais acostumado.
Latentes por trás da
mensagem imediata dos versos, talvez algumas ideias subliminares: (i) um certo
desassossego da mãe do garoto em relação a um hipotético desaparecimento de seu
próprio filho – incrustado nos versos em que compara a estrutura física deste
com a do menino desaparecido, como que tentando se assegurar da maior
maturidade de seu rebento, capaz de livrá-lo de evasões que tais; e (ii) o
conjectural recado, do garoto maior à sua genitora, de que, porventura, vem
sendo alimentado por comidas não exatamente de seu agrado ou a que já está
completamente familiarizado.
J.A.R. – H.C.
Sharon Olds
(n. 1942)
The Missing Boy
for Etan Patz
Every time we take
the bus
my son sees the
picture of the missing boy.
He looks at it like a
mirror – the dark
blond hair, the pale
skin,
the blue eyes, the
electric-blue sneakers with
slashes of jagged
gold. But of course that
kid is little, only
six and a half,
an age when things
can happen to you,
when you’re not
really safe, and our son is seven,
practically fully
grown – why he, would
tower over that kid
if they could
find him and bring
him right here on this bus and
stand them together.
He sways in the silence
wishing for that, the
tape on the picture
gleaming over his
head, beginning to
melt at the center
and curl at the edges as it
ages. At night, when
I put him to bed,
my sons holds my hand
tight
and says he’s sure
that kid’s all right,
nothing to worry
about, he just
hopes he’s getting
the food he likes,
not just any old
food, but the food
he likes the most,
the food he is used to.
Perdido
(Frederick McCubbin:
pintor australiano)
O Menino Desaparecido
para Etan Patz
Toda vez que tomamos
o ônibus
meu filho vê a foto
do menino desaparecido.
Olha para ela como um
espelho – o cabelo
Iouro escuro, a pele
clara,
os olhos azuis, o
tênis azul-metálico com
listras em ouro
recortado. Mas, é claro, aquele
menino é pequeno,
apenas seis anos e meio,
idade em que coisas
podem acontecer,
quando não se está
realmente seguro, e Gabriel tem sete,
praticamente já de
todo crescido – ora, ele seria
um gigante, comparado
àquele menino, se pudessem
encontrá-lo e
trazê-lo aqui neste ônibus e
colocá-los lado a
lado. Seu corpo balança em silêncio,
desejando que isso
acontecesse, o adesivo na foto
brilhando acima de
sua cabeça, começando a
despregar no centro e
curvar nas pontas, à medida em que
o tempo passa. À
noite, quando o levo para a cama,
meu filho aperta
minha mão
e diz que tem certeza
de que aquele menino está bem,
não há porque se preocupar,
apenas
espera que ele esteja
comendo a comida de que gosta,
e não qualquer
comida, mas a comida
de que mais gosta, a
comida a que está acostumado.
Referência:
OLDS, Sharon. The missing
boy / O menino desaparecido. Tradução de Maria Lúcia Milléo Martins. In:
O’SHEA, José Roberto (Org.). Antologia de poesia norte-americana
contemporânea. Edição bilíngue: inglês x português. Tradução de Maria Lúcia
Milléo Martins. Florianópolis, SC: Ed. da UFSC, 1997. Em inglês: p. 154; em
português: p. 155.
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