Como se sentisse
perdido, incompleto, desenraizado ou fora de lugar, e necessitasse de ajuda
para reencontrar o seu caminho, o poeta busca uma espécie de redenção ou
consolo por meio da emissão de petições dirigidas a elementos ou bem naturais
ou bem abstratos: água, árvore, errância, versos, ouro, tempo, corpo, alma,
entre outros.
Sobressai na dicção
do poema o desejo de restauração de sua própria identidade, de reconciliação do
falante com o seu mundo interno, à procura de paz e de tranquilidade num mundo
que lhe parece cheio de adversidades e de desconcerto: a bem da verdade, o tom
existencialista dos versos são concordes ao tema perda, quando alguém se vê a
sós, sem a presença física dos genitores que partiram há poucos dias, e
passasse a se perceber, doravante, como o novo ponto de referência a partir do
qual os de sua linha descendente vêm buscar a água viva da fonte, estando ele
preparado ou não para tanto.
J.A.R. – H.C.
Samuel Feijóo
(1914-1992)
Recuento
Nada más puedo ser,
ayúdame tarde;
un caminante oscuro
por la orilla
otoñal del agua)
ayúdame agua;
una canción perdida
siempre
bajo un árbol apenas
visible,
ayúdame árbol;
un ojo de niño
condenado,
un enfermo que vaga
sin ruta,
ayúdame errancia;
un poeta de puro
sortilegio,
un tan vago sonido
cayendo:
ayúdame verso;
un amor que ha
encendido los fuegos
de oro, del joven
oro:
oro, ayúdame.
Ah, vasto campo,
tiempo tan bello
monótono cayendo en
mi pérdida
fría, acude, ¿puedes
calentarme como una
transida doncella
con tiernas pausas,
correspondencias turbadas,
con pensamientos con
el sueño de la yerba,
entrando en locura
jubilosa
como llama vasta y
santa, canto
vívido, honor del
mundo?
Ah, cuerpo mío,
condenado suave,
alma de mi cuerpo,
sola de mi cuerpo, pájaro
anidando en su solo
nido, su único
arrimo de pajas
rotas, devuélveme, ayúdame:
hazte pacífico para
que yo lo sea, restaura,
enloquece, suave,
sonríe, heroico cae
en tu sórdido lecho
noblemente si puedes.
Abril 11, 1956
(Muerte de mi madre)
(De: “La hoja deI
poeta”, 1957)
Pintor deitado sob um
guarda-chuva
numa clareira da floresta
(Carl Spitzweg:
artista alemão)
Inventário
Nada mais posso ser,
ajude-me tarde;
um caminhante escuro
pela beira
outonal da água,
ajude-me água;
uma canção sempre
perdida
sob uma árvore apenas
visível,
ajude-me árvore;
um olho de criança condenada,
um doente que vaga
sem rumo,
ajude-me errância;
um poeta de puros
presságios,
um som tão vago
caindo:
ajude-me verso;
um amor que acendeu
os fogos
de ouro, do jovem
ouro:
ouro, ajude-me.
Ah, vasto campo,
tempo tão belo
monótono caindo em minha
perda
fria, acode. Pode
esquentar-me como uma
transida donzela
com pausas ternas,
correspondências turvas,
com pensamentos com o
sonho da erva,
entrando em loucura
jubilosa
como chama vasta e
santa, canto
vívido, honra do
mundo?
Ah, corpo meu, condenado
suave,
alma de meu corpo, só
de meu corpo, pássaro
aninhando em seu
único ninho, seu único
arrimo de palhas
rotas, devolva-me, ajude-me:
faça-se pacífico para
que eu o seja, restaure,
enlouqueça, sorria
suave, caia heroico,
nobremente, em seu
sórdido leito, se puder.
11 de Abril de 1956
(Morte de minha mãe)
(De: “A folha do
poeta”, 1957)
Referência:
FEIJÓO, Samuel. Recuento
/ Inventário. Tradução de Alai Garcia Diniz e Luizete Guimarães Barros. In:
LEMUS, Virgilio López (Seleção, prefácio e notas). Vinte poetas cubanos do
século XX. Tradução de Alai Garcia Diniz e Luizete Guimarães Barros. Edição
bilíngue. Florianópolis, SC: Ed. da UFSC, 1995. Em espanhol: p. 140 e 142; em
português: p. 141 e 143.
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